História do pensamento cristão resumo

 


 

História do pensamento cristão resumo

 

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História do pensamento cristão resumo

 

CAPÍTULO I – TEOLOGIA PATRÍSTICA

 

Introdução

 

A história do Pensamento Cristão é um ramo da História da Igreja Cristã que aborda o desenvolvimento dos dogmas e doutrinas da Igreja. Também inclui temas relacionados com questões filosóficas, éticas, políticas e sociais. Neste trabalho nos limitamos a estudar a contribuição teológica de vários personagens da Igreja Cristã.  

O estudo da História do pensamento Cristão tem como objetivo principal compreender a igreja atual através de sua jornada no passado.

As fontes primordiais são os textos teológicos, credos, sermões, comentários, enfim toda a produção literária dos líderes e teólogos cristãos no decorrer dos séculos.

 

Patrística

 

O termo Patrística se refere ao estudo dos pais da Igreja, ou os primeiros teólogos e líderes da Igreja desde o período pós-apostólico até por volta do século VII. Existem várias divisões propostas para a Patrística, adotaremos a seguinte: pais apostólicos, pais apologistas, pais polemistas, pais alexandrinos, pais nicenos e pais pós-nicenos.

 

1) Pais Apostólicos

Os pais pós-apostólicos são os autores cristãos do fim do primeiro século e do início do segundo cujos escritos chegaram até nós.

Os mais importantes desses escritos são:

1.a Epístola de Clemente Romano (escrito por volta do ano 95)

Os cristãos de Corinto estavam se rebelando contra seus líderes, Clemente os exorta a obedecerem seus presbíteros e encerraram com a disputa.Cerca de 150 citações do AT e das cartas paulinas são feitas pelo autor.Entre os escritos dos pais da Igreja, essa carta é considerada a mais antiga.

Sete epístolas de Inácio de Antioquia (115)

 

O autor era Bispo de Antioquia, na Síria, foi preso por professar sua fé. Durante sua viagem para ser martirizado em Roma, ele escreveu essas sete cartas endereçadas às igrejas com o objetivo de orientá-las e consola-las.Também as alerta para o perigo das heresias relacionadas às concepções sobre a pessoa de Cristo.

 

Epístola de Policarpo de Esmirna, (110)

 

Acredita-se que tenha sido discípulo direto do Apóstolo João. Sua carta testemunha seu martírio numa fogueira . Escreveu aos filipenses repetindo muitas informações recebidas pelos apóstolos.

 

Epístola de Barnabé (130)

 

Carta que utiliza como pseudônimo Barnabé. Seu estilo é semelhante ao estilo da carta dos Hebreus procurando interpretar eventos e personagens do AT de maneira simbólica para tipificar a Jesus.

 

2.a Epístola de Clemente Romano (140)

 

Apesar do nome não se trata de uma carta e tampouco foi escrita por Clemente. Trata-se de um sermão de exortação e consolo a igreja que estava passando por duras perseguições romanas. 

 

Pastor de Hermas

 

Escrito apocalíptico que através de visões retrata eventos relativos ao final dos tempos. Esse livro foi mencionado na primeira lista de livros canônicos (cânon muratoriano) como livro recomendado para a leitura. Teólogos como Clemente de Alexandria o considerava como livro do NT.

 

Fragmentos de Papias de Hierápolis (150)

 

Esses escritos são encontrados em citações de outros pais da igreja, sua obra extensa, cerca de cinco volumes, infelizmente se perdeu. Papias trás informações valiosas sobre a história dos apóstolos depois do NT.  

 

Didaché , o ensino dos Doze Apóstolos (150)

 

O Didaché é conhecido como o mais antigo manual da Igreja, provavelmente teria sido escrito na Síria ou Palestina. Possui três divisões principais: os dois caminhos; instruções sobre o batismo e a ceia; regras para os profetas itinerantes, presbíteros e diáconos.

 

Os escritos desse período são simples e diretos. Visam resolver problemas das igrejas locais e refletem as dificuldades enfrentadas tanto no combate a alguns grupos heréticos como na perseguição romana aos cristãos. O cânon do Novo testamento ainda não tinha sido oficializado e a autoridade aos poucos repousava sobre os bispos. Rapidamente a ênfase da salvação pela graça de Paulo é substituída por um legalismo crescente.

 

2) Pais Apologistas Gregos

 

São os pais da igreja que se destacaram na defesa da fé contra os ataques do paganismo romano e do judaísmo. Sua preocupação principal era refutar os argumentos contrários à fé cristã. Dentre eles destacamos:

Aristides de Atenas (140)

Elaborou uma apologia endereçada ao imperador Antonino Pio, demonstrando a superioridade do cristianismo em comparação as formas de culto pagãos e judaicos.. Ressaltou a ética e os costumes dos primeiros cristãos..

Justino Mártir (150)

Filósofo, fundador de uma escola conhecida por ensinar a “verdadeira filosofia”. Juntamente com seus discípulos foi martirizado por confessar sua fé em Cristo. Escreveu duas apologias, uma delas endereçada ao Judeu Trifo. Também defendeu o cristianismo das acusações dos romanos escrevendo para o Imperador Antonino Pio e ao senado romano.

Além desses apologistas destacamos Aristides, Taciano e Atenágoras. Todos esses escritores procuraram provar que as acusações feitas pelos romanos de que os cristãos eram subversivos, ateus, imorais e até canibais (comiam carne e sangue de crianças) eram infundadas. Além disso, escritores como Justino Mártir, procuravam fazer uma ponte entre a filosofia grega e o cristianismo. Justino utilizava o termo logos que era conhecido no pensamento grego para anunciar Cristo. Segundo ele vários filósofos fizeram declarações coincidentes com o Evangelho, isso se deve ao fato de que Cristo, o logos (a razão) é pré-existente os teria inspirado no passado.

3) Pais Polemistas

Os pais polemistas ou pais anti-gnósticos se dedicaram ao combate das heresias gnósticas. Tais heresias ameaçavam a integridade da mensagem cristã e a unidade da igreja. Dois teólogos em especial se destacam no confronto ao gnosticismo.

 

Irineu de Lyon (177)

 

Discípulo de Policarpo de Esmirna, Irineu tornou-se bispo na Gália. Dois escritos dele chegaram até nós: Contra os Hereges e Epideixis. O primeiro é uma ampla refutação ao gnosticismo e o segundo apresenta as doutrinas básicas da proclamação apostólica. Ele é conhecido como o pai da dogmática cristã.

 

Tertuliano de Cartago( 220)

 

Foi o principal polemista da Igreja de fala latina. Possuía uma formação em direito dono de uma excelente retórica. Dedicou-se tanto na apologia da igreja em relação ao estado romano como no ataque ao gnosticismo. Suas obras eram incisivas e exerceram grande influência pelo seu estilo popular. No final de sua vida acredita-se ter se filiado a um movimento cristão extremista chamado de montanismo. Suas principais obras foram: Contra Marcion, Prescrição aos Hereges e Contra Praxeas.

 

Gnosticismo

 

Não havia apenas um tipo de gnosticismo, alguns líderes se destacavam como Basílides, Cerinto e Valentino que defendiam variações distintas desse sistema religioso. Basicamente o gnosticismo defendia a existência de eons, seres espirituais que emanavam de Deus e traziam ao homem um conhecimento (gnose) místico e seleto. Os homens eram divididos em três tipos: pneumáticos (espirituais), psíquicos (morais) e somáticos (carnais). Segundo eles somente os espirituais e os psíquicos (em menor parte) poderiam ser iniciados na gnose. Pregavam uma espécie de dualismo religioso. Todo o mundo material era intrinsecamente mau, a gnose libertava o homem da influência da matéria para o mundo espiritual. Os eons seriam os intermediários que elevavam o homem a níveis superiores ao do mundo material.

 

Os gnósticos cristãos defendiam entre outras coisas que Cristo não podia ter se encarnado, pois assim não seria divino. Também defendiam a idéia de que o mundo seria um aborto do mundo espiritual, obra de um eon menor e não de Deus. 

 

4)Pais Alexandrinos

 

            Alexandria era um dos principais centros culturais do império romano. Nesta cidade floresceu uma escola teológica cristã que utilizava o método alegórico para interpretação das escrituras. O método consistia em descobrir um sentido mais profundo de cada passagem. Exemplificando os tipos de interpretação: a literal seria semelhante à água, (servia para tirar a sede); a moral seria como o suco de uva (acrescentava sabor); a alegórica seria  como o vinho (além de tirar a sede também inebriava). Os pais alexandrinos podem ser considerados portadores de uma teologia mais especulativa justamente por utilizarem o método alegórico.

 

Clemente de Alexandria

 

            Discípulo de Panteno que foi o primeiro teólogo de renome da escola catequética de Alexandria. Clemente superou seu mestre. O aspecto fundamental de sua teologia é a idéia da pedagogia de Deus. Segundo ele, o homem caído só pode reunir-se com Deus através da educação cristã. Essa educação é mediada pelo Logos, Jesus Cristo. Suas obras mais conhecidas são: Admoestação aos Gregos, Pedagogo e as Miscelânias.

 

Orígenes de Alexandria

 

            Certamente o maior representante dessa escola. Escritor prolífico de uma produtividade espantosa, chegava a ditar para seus escribas várias obras de uma vez. Seu trabalho é composto por comentários, sermões e edições de textos. Jerônimo calculou que produzira cerca de 2000 escritos. Duas obras se destacam: Hexapla (seis diferentes traduções do AT em colunas paralelas) e Do Princípio (obra que apresenta o seu sistema teológico)

 

            A forte influência da filosofia grega no pensamento dessa escola foi alvo de críticas e condenações. O V Concílio (553) considerou a produção de Orígenes herética, porém sua influência no Oriente foi tão importante quanto a influência de Tertuliano do Ocidente.

 

5) Pais Pós-Nicenos

 

            Consideramos como pais pós-nicenos os pais da igreja que exerceram suas atividades a partir do I Concilio (325) na cidade de Nicéia.

 

No ano de 313 o imperador Constantino promulgou o edito de Milão que considerava o cristianismo religião lícita. Com tal edito os cristãos gozavam dos mesmos direitos dos pagãos pondo fim as perseguições pelo império. Constantino também financiou a realização do concílio de Nicéia que tinha como objetivo organizar e congregar a liderança da igreja cristã. Apesar do ambiente de alegria por causa da almejada paz e da confraternização de líderes da igreja dos cantos mais remotos do império, havia uma séria divisão doutrinária que ameaçava a unidade da igreja.

 

Ário de Alexandria encabeçava um grupo no Concílio que defendia a tese de Jesus havia sido criado por de Deus, logo não podia ser considerado divino. Baseado no versículo: “ tu és meu filho e hoje eu te gerei”, Ário afirmava que houve um tempo em que Jesus não existia. Esse pensamento foi chamado de arianismo. Tertuliano no século passado já havia  debatido com Praxeas sobre outra idéia semelhante que dizia que o Pai e Jesus na verdade não eram pessoas diferentes, apenas manifestações da mesma pessoa. Sabélio, condenado por sua idéias em 261, defendia que o Pai, o Filho e o Espírito santo eram apenas modos de Deus se apresentar ao homem (modalismo).  Tertuliano na época definiu a trindade como sendo composta por três pessoas diferentes em uma substância divina, estabelecendo uma definição que é a aceita pela cristandade como a mais ortodoxa. No Concílio de Nicéia novamente a questão voltaria a ser discutida.

 

Atanásio de Alexandria

 

Coube a Atanásio defender o conceito trinitariano contra o unicismo de Ário. Ele era um homem de pele escura e pequena estatura, foi um teólogo habilidoso e um escritor prolífico. No Concílio como diácono ele não podia participar diretamente, mas foi ele quem municiou com argumentos o bispo Alexandre contra o pensamento de Ário. Três obras se destacam nesse período de embates: Discursos Contra os Arianos; Sobre os Decretos do Concílio de Nicéia  e Apologia Contra os Arianos.

 

Basílio de Cesaréia (330-379)

 

Membro de uma família rica que além dele tinha outro teólogo, seu irmão Gregório de Nissa. Ensinou retórica e posteriormente se dedicou a vida religiosa. Em Cesaréia se dedicou a escrever contra o arianismo e postulou a seguinte fórmula trinitária: no Ser divino há uma só “ousia” (substância,essência) e três hipóstases (distinções pessoais). Também deu uma atenção especial ao estudo do Espírito Santo defendendo sua divindade.

 

Gregório de Nazianzo (330-390)

 

Destacou-se como orador e poeta, amigo de Basílio figurou entre os defensores do pensamento trinitário junto com Basílio e Gregório de Nissa. Seus “Discursos Teológicos” , uma série de sermões marcou a fundamentação da doutrina trinitária. Preocupo-se em entender o relacionamento entre as pessoas da trindade. Segundo ele , o Pai não é gerado, o Filho é gerado e o Espírito santo é procedente.

 

Gregório de Nissa (335-395)

 

O mais destacado entre os três capadócios, foi brilhante teólogo utilizando o neoplatonismo. Suas obras principais são: Sobre a Trindade, Não três Deuses: para Ablábio e Contra Eunômio. Refutou a acusação de triteísmo de seus adversários e alaborou tese de que na trindade apesar das diferentes personalidades em virtude de sua essência divina, toda a ação é comum às três pessoas.

 

Os capadócios, Basílio, Gregório de Nissa e Nazianzo junto com Atanázio foram fundamentais na cristalização da doutrina trinitariana. Foram protagonistas importantes no Concílio de Constantinopla que de uma vez por todas rechaçou qualquer outra idéia herética sobre a composição divina. Nesse Concílio foi revisado o Credo niceno e fortalecido ficando conhecido como credo niceno-constantinopolitano.

 

Ambrósio de Milão( 340-397)

Ambrósio era gaulês descendente de gregos. Seu pai exercia uma alta função no império.Em Roma, recebeu a formação dos nobres romanos, estudando gramática, literatura grega e romana, retórica e direito. Não lhe faltaram ainda a frequência ao circo e ao teatro. Ao lado dessa formação, recebeu, também, educação religiosa, destinada aos catecúmenos. De uma maneira curiosa chega ao bispado. No cargo de prefeito da cidade agiu com tanta eficácia apartando uma briga entre cristãos e arianos que deposi de várias tentaivas de recusa ele entendeu ser a vontade divina e tornou-se um dos mais brilhantes bispos da patrística.isputavam entre si o cargo de bispo que os partidos opostos o elegeram com bispo. Sua moral e autoridade eram reconhecidas por todos. Chegou a impedir o imperador de participar da ceia por ter se envolvido num massacre em Tessalônica. Sua obra tem um caráter pastoral, escreveu hinos e homilias.                                  Ambrósio de Milão

Jerônimo (340-420)                                                   

Nasceu perto da fronteira da Itália com a Dalmácia. Estudou em Roma construindo uma ampla biblioteca pessoal de clássicos. Aos dezenove anos renunciou a carreira secular e dedicou-se a vida monástica. A maior realização de Jerõnimo foi a sua tradução em latim da bíblia – a Vulgata ou a versão comumente usada., como ficou conhecida mais tarde.

Controvérsia Cristológica

A Cristologia tem sido debatida incansavelmente durante séculos, em várias nações, dentro de várias correntes cristãs, com pontos de vista semelhantes, divergentes e mesmo com algumas controvérsias. Alguns aspectos deste assunto muito debatidos no eixo central da cristologia no decurso da história se refere a natureza de Cristo.Entre as principais escolas que buscaram determinar a natureza de Cristo temos:

  • Arianismo, que crê que Jesus, apesar de um ser superior, seja inferior ao Pai sendo uma criatura sua;
  • Docetismo, defende que Jesus era um mensageiro dos céus e que seu corpo era "carnal" apenas na aparência e sua crucificação teria sido uma ilusão;
  • Ebionismo, que crê em Jesus como um profeta, nascido de Maria e José, que teria se tornado Cristo no ato do batismo;
  • Monofisismo, segundo a qual Cristo teria uma única natureza composta da união de elementos divinos e elementos humanos.
  • Nestorianismo, segundo a qual Jesus Cristo é, na verdade, duas entidades vivendo no mesmo corpo: uma humana (Jesus) e uma divina (Cristo).
  • Sabelianismo, o qual defendia que Jesus e Deus não eram pessoas distintas, mas sim "aspectos" ou "modos" diferentes do trato da Divindade com a humanidade ;
  • Trinitarianismo, que crê em Jesus como a segunda pessoa da Trindade divina .

O IV Concílio realizado em Calcedônia na Ásia Menor teve como assunto principal a natureza de Jesus Cristo. Nele foi repudiada a doutrina de Eutiques do monofisismo e declarada a dualidade humana e divina de Jesus. Assim, segundo o pensamento cristão Jesus seria uma pessoa com duas naturezas, a divina e a human.Por não ter sido aceito por alguns movimentos cristãos ortodoxos, surgiu igrejas monofisitas como a Igreja Copta e outras Igrejas nacionais.

Agostinho de Hipona (354-430)

Foi o principal nome da patrística. Bispo cristão, teólogo e filósofo.Agostinho cresceu no norte da África colonizado por Roma, educado em Cartago. Foi professor de retórica em Milão em 383. Seguiu o Maniqueísmo nos seus dias de estudante e se converteu ao cristianismo pela pregação de Ambrósio de Milão. Foi batizado na Páscoa de 387 e retornou ao norte da África, estabelecendo em Tagaste uma fundação monástica junto com alguns amigos. Em 391 foi ordenado sacerdote em Hipona. Tornou-se um pregador famoso (há mais de 350 sermões dele preservados, e crê-se que são autênticos) e notado pelo seu combate à heresia do Maniqueísmo. Defendeu também o uso de força contra os Donatistas, perguntando "Por que (...) a Igreja não deveria usar de força para compelir seus filhos perdidos a retornar, se os filhos perdidos compelem outros à sua própria destruição?"Em 396 foi nomeado bispo assistente de Hipona, e permaneceu como bispo de Hipona até sua morte em 430.Agostinho morreu em 430, durante o cerco de Hipona pelos Vândalos. Diz-se que ele encorajou seus cidadãos a resistirem aos ataques, principalmente porque os Vândalos haviam aderido ao arianismo, que Agostinho considerava uma heresia.

Sua vida é contada em “Confissões”, obra autobiográfica que narra sua trajetória desde o paganismo até a conversão. Sua produção teológica amadureceu em meio as controvérsias que se envolveu.

Como seguidor do maniqueísmo em sua vida pregressa, Agostinho se aprofunda no problema do mal e encontra no cristianismo a solução. Escreve , Da Natureza do bem, obra que critica o dualismo religiosos do maniqueísmo e neoplatonismo.

Outro embate importante foi contra os donatistas. Esses acreditavam que um batismo ou ceia ministrados por um bispo indigno não possuía valor. Eram extremamente rigorosos e moralistas. Em sua obra, Sobre o Batismo, Agostinho salienta duas questões a natureza da igreja e a validade dos sacramentos. Quanto ao batismo ele entende que a graça de Deus transcende a situação do ministrante e por isso tem validade.

Sem dúvida a disputa mais importante foi contra Pelágio. Este negava o pecado original, a graça salvadora de Deus e afirmava a possibilidade do homem pelas seu próprio livre arbítrio viver sem pecado. Baseado em Romanos, agostinho reafirma o ensino paulino do pecado original, da graça salvadora em Cristo em a corruptibilidade humana. Algumas das principais obras de Agostinho forma escritas nesse período: Do Espírito e da Letra, Da natureza e da graça, Da graça de Cristo e do Pecado Original, Da Graça e do Livre Arbítrio, Da Predestinação dos Santos.

A obra prima de Agostinho foi A cidade de Deus. Motivado pela invasão dos bárbaros no império romano, ele procura responder as perguntas do pagãos que culpavam a derrocado de Roma pelo seu abandono aos deuses. Ele conclui dizendo que o Reino de Deus não deve ser confundido com um reino humano e não seria afetado pela queda de Roma. Os bárbaros dominaram Roma mas se tornaram cristãos.

 

CAPÍTULO II – TEOLOGIA MEDIEVAL

 

Igreja Católica Romana

 

Embora a Igreja Católica afirme que é a mesma Igreja que surgiu no período neotestamentário a história temo mostrado uma outra realidade, o catolicismo romano possui ênfases doutrinárias diferentes da igreja primitiva. Dois fatos contribuíram para essa mudança: semipelagianismo e o Papa Gregório Magno.

 

Semipelagianismo

 

Pelágio como já foi dito anteriormente negava o pecado original, a graça salvadora de Deus e afirmava a possibilidade do homem pelo seu próprio livre arbítrio viver sem pecado. Agostinho de Hipona combateu o pelagianismo, porém suas idéia sobre a soteriologia não foram totalmente aceitas. João Cassiano (360-435) liderou uma espécie de semipelagianismo.

 

Segundo sua obra Conferências ele defendeu a proposição de que a natureza e a iniciativa humanas, por si sós, sem a graça sobrenatural, são capazes de provocar uma reação de Deus no sentido de conceder a salvação. Essa posição foi condenada em 529 pelo Sínodo de Orange, contudo na prática a Igreja adotou uma concepção em que o livre-arbítrio precisa cooperar com a graça para que a salvação se complete. As obras meritórias e penitências se tornaram populares e importantes para a salvação do indivíduo.

 

Gregório Magno

 

Considerado por muitos como o último pai da igreja, Gregório proveniente de uma família aristocrática, foi uma influência decisiva para o catolicismo romano. Dentre os seus principais feitos destaca-se: a reorganização da igreja ocidental depois da queda do império romano; fortalecimento da Sé romana; mudanças litúrgica como a introdução do canto gregoriano; padronização da regra beneditina nos mosteiros.

 

Gregório foi o responsável pela oficialização da crença no purgatório e na missa como sacrifício. Em sua doutrina da penitência, Gregório desenvolveu o conceito de satisfação como meio pelo qual a punição eterna podia ser mitigada ou removida, evidentemente havia uma conexão com a idéia do purgatório. Para ele escapava do purgatório apenas os penitentes perfeitos que viviam como monges, ele negou a salvação para a maioria dos cristãos.Também promoveu práticas populares como veneração de santos, penitências e dias festivos. Os protestantes rejeitaram a maioria de suas idéias.

 

Igreja Ortodoxa Grega

 

A Igreja no Oriente nunca conseguiu ser independente dos poderes políticos como a do Ocidente. Quando houve a queda do império romano a Igreja Ocidental acumulou para si além do poder religiosos, o poder político.

Desde Constantino que transferiu a capital do império para Constantinopla em 330, foi pavimentada a estrada que traria uma separação política e posterirormente religiosa.

 

A visão intelectual diferente entre as duas igrejas foi um fator preponderante. O Ocidente era mais prático, dado a administração enquanto no Oriente a mente grega, mais inquisitiva, trouve várias controvérsias teológicas.

 

As duas igrejas também diferiam em matérias teológicas, tais como:

 

- Cláusula filioque no texto do Credo Niceno. O Ocidente sustentava que o espírito Santo procedia do Filho e do Pai. O Oriente não aceitava essa interpretação alegando que isso inferiorizava o Espírito Santo e consequentemente uma negação da Trindade.

 

- Controvérsia sobre a data da Páscoa. A igreja no Oriente defendia que a Páscoa devia ser celebrada no dia 14 de nisan, a data segundo o calendário judaico, independentemente do dia em que ela caísse. Em 162, o bispo de Roma Aniceto foi contrário a data oriental defendendo que a data deveria ser o domingo seguinte ao 14 de nisan. Desde o século segundo essa questão sempre tornou difícil a relação entre os dois grupos.

 

- A questão do celibato e da barba. No Oriente apenas aos bispos o celibato era obrigatório, mas no Ocidente todos os clérigos não podiam contrair casamento. O mesmo aconteceu em relação a barba, no Oriente todos os clérigos deveriam usá-la enquanto no Ocidente o uso não era obrigatório.

 

- Controvérsia iconoclasta. A igreja no Ocidente usava imagens e esculturas no culto, enquanto a Igreja Oriental eliminou as esculturas conservando apenas os ícones (imagens de Cristo que poderiam ser reverenciadas mas não adoradas).

 

- Nomeação do patriarca de Constantinopla. O papa Nicolau i em meados do século IX tentou interferir na nomeação do patriarca da Igreja Oriental, causando ressentimentos mesmo na época os motivo terem sido justificáveis.

 

Cisma Católico-Ortodoxo

 

Em 1054, todas essas diferenças e todos esses antagonismos centralizaram-se em torno daquilo que parecia ser o problema menor. Miguel Cerulário, patriarca de Constantinopla (1043-1058) condenou a igreja ocidental por usar pão não levedado na Eucaristia. O papa Leão IX enviou o cardeal Humberto para por fim à polêmica. Em virtude de todos esses antagonismos o resultado foi o Cisma de 1054. Os dois líderes se excomungaram mutuamente criando a primeira grande divisão da Igreja. Essa mútua excomunhão só foi revogada em 1965 sem contudo reunificar as igrejas.

 

 Teologia Carolíngia

 

O Império Carolíngio, também conhecido como o Império de Carlos Magno, foi o momento de maior esplendor do Reino Franco (ocupava a região central da Europa). Este período ocorreu durante o reinado do imperador Carlos Magno (768 – 814).

Na área educacional, o monge inglês Alcuíno foi o responsável pelo desenvolvimento do projeto escolar de Carlos Magno. A manutenção dos conhecimentos clássicos (gregos e romanos) tornou-se o objetivo principal desta reforma educacional. As escolas funcionavam junto aos mosteiros (escolas monacais), aos bispados (escolas catedrais) ou às cortes (escolas palatinas). Nestas escolas eram ensinadas as sete artes liberais: aritmética, geometria, astronomia, música, gramática, retórica e dialética.

Escolástica

 

O termo escolástica se origina do grego schole, que significa lugar onde se aprende. Nasce com o surgimento das universidades. Dois tipos de universidades são comuns nesse período: o italiano, onde os alunos organizavam e administravam suas próprias escolas; o francês, seguindo o modelo monástico, a faculdade era constituída dos professores e administradores da escola. O currículo era baseado no trivium (gramática, lógica e retórica); quadrivium (música, aritmética, geometria e astronomia) e claro, teologia.

 

A escolástica pode ser definida como a tentativa de racionalizar a teologia para que se sustente a fé com a razão. Os dados da revelação bíblica eram organizados através da lógica dedutiva de Aristóteles. É importante salientar que a busca da escolástica não era pela verdade, mas sim organizar racionalmente um corpo de verdades aceitas ,sejam através da fé ou da razão, num corpo harmônico.

 

A partir da filosofia grega, seja Platão ou Aristóteles, os escolásticos se dividiram  em tendências no tratamento da natureza dos universais ou da realidade última de todas as coisas, bem como a relação entre fé e razão. São encontradas pelo menos três tendências predominantes na escolástica: Realismo, realismo moderado e nominalismo. A seguir a definição de cada tendência seguida pelos seus principais representantes.

 

Realismo

 

Platão ensinava que os universais (idéias) tinham uma existência objetiva independentemente das coisas particulares. Cria-se por exemplo que há universais de beleza, verdade e bondade fora dos atos particulares do homem de beleza, verdade e bondade. A frase latina que resumia essa tendência era universalia ante rem , isto é, os universais existem antes das coisas criadas.

 

Anselmo (1033-1109)

 

Nasceu no norte da Itália, foi educado na abadia de Bec, tornou-se Arcebispo de Canterbury em 1093. Sobre a relação entre fé e razão Anselmo sintetizou-a na frase: Credo ut Intelligam (Creio para que possa entender). Segundo ele a fé deve ser o fundamento do conhecimento.

Anselmo também idealizou dois argumentos em prol da existência de Deus: O Monologium e Proslogium. O primeiro argumento é cosmológico, procura explicar a existência de Deus através de sua criação. Como tudo o que existe subentende um criador o regresso até a origem remete a existência de Deus. O segundo argumento é ontológico, relativo ao ser, como todos possuem uma idéia de um ser supremo essa idéia inicial deve proceder do próprio Deus.

Outra importante contribuição de Anselmo foi a sua teoria da Expiação em sua obra Cur Deus Homo ( Por que Deus se fez Homem). O homem, segundo ele, ao desobedecer a Deus contraiu uma dívida que só foi paga pelo sacrifício de Jesus na cruz do Calvário. Pela morte vicária de Cristo o homem ficou livre dessa obrigação.

 

 Pedro Lombardo (1100-1160)

 

Brilhante professor da Universidade de Paris escreveu um dos mais importantes livros da Igreja medieval. Quatro livros das Sentenças ou apenas Sentenças como era conhecido. Neste trabalho dividido em quatro capítulos Pedro Lombardo trata: sobre Deus como objeto da felicidade humana; como o homem pode alcançar a felicidade; a doutrina de Cristo; os sacramentos e escatologia. Nesta obra de Pedro Lombardo são definidos os sete sacramentos: batismo, eucaristia, crisma, casamento, ordenação, confissão e extrema-unção.

 

Realismo Moderado

 

Diferentemente de Platão, Aristóteles possuía uma visão moderada da natureza da realidade. Ele defendia que os universais ou idéias possuíam uma existência objetiva, embora não existissem aparte das coisas individuais mas sim nelas. A frase que resume essa idéia é: universalia in re. Os escolásticos que adotaram essa idéia foram chamados de realistas moderados ou conceptualistas.

 

 

Abelardo (1079-1142)

 

O mais famoso professor de sua época. Mestre na universidade de Paris chegou a ter milhares de alunos em suas classes. Utilizava a maiêutica como principal método didático. Era um realista moderado, cria que a realidade existia, primeiro na mente de Deus, depois aqui e agora, em indivíduos e coisas, não acima e além desta vida, e finalmente na mente do homem. Em relação à questão fé e razão acreditava na idéia do intelligo ut credam (sei para que possa crer). Salientava a importância da dúvida no processo de conhecimento. Sua principal obra Sic et Nunc destacava 158 proposições contraditórias entre os pais da igreja com o objetivo de discuti-las e soluciona-las.Sobre a expiação acreditava na influência moral da Expiação, isto é, Jesus morreu na cruz para gravar no homem o amor de Deus, pelo que o homem assim influenciado entregaria sua vida a Deus. Seu apego a razão trazia desconfiança e receio dos seus adversários.

 

Alberto Magno (1225-1274)

 

Nascido em Colônia, também lecionou na Universidade de Paris. Era conhecida como Doutor Universal. Suas principais obras são verdadeiros compêndios de ciência teológica e natural num esforço para conciliar razão e religião.

 

Tomás de Aquino (1225-1274)

 

Proveniente de um berço nobre, sua mãe era irmã de Frederico Barba Roxa. Foi educado em Monte Cassino e na Universidade de Nápoles, contra a vontade de seus pais tornou-se monge.

 

Sua obra principal, também é a base do catolicismo romano, é a Summa Theologiae. Nela Tomas de Aquino procurou harmonizar as áreas da fé e da razão numa totalidade da verdade. Segundo ele como ambas vêem de Deus não poderia haver contradições entre as duas. A Summa consiste em três mil artigos, com mais de 600 questões em três grandes seções. Na verdade pretendia ser uma exposição sistemática de toda a teologia. A obra está dividida desta forma: a primeira parte trata da trindade e a criação; a segunda, o avanço do homem para Deus; a terceira seção discorre sobre o caminho para Deus através de Cristo e de sua encarnação,vida,morte e ressurreição, conclui com os sacramentos como meios de graça instituídos por Cristo.

 

Tomás de Aquino racionalizou a idéia das indulgências, criadas para isentar da satisfação normalmente necessária no sacramento da penitência, ao ensinar a eficácia dos méritos de Cristo e dos santos. Nesse caso a igreja poderia utilizar esses méritos para a ajuda do penitente.

 

Nominalismo

 

A tendência nominalista se opunha ao realismo e realismo moderado. Suas idéias foram expressas na frase: universalia post rem. Verdades ou idéias gerais não têm existência objetiva a não ser como resultado da observação das coisas particulares. Desta forma os nominalistas são os precursores dos empiristas dos séculos XVII e XVII e da ciência experimental.

 

Jonh Duns Scotus (1265-1308)

 

Scotus nasceu na Escócia, filiou-se aos franciscanos e foi ordenado em 1291. Estudou em Oxford, lecionou nessa faculdade e em Cambridge e Paris. Ele afirmou a primazia da vontade de Deus sobre o intelecto humano. Como conseqüência de sua vontade divina Ele predestina soberanamente os eleitos para a salvação, deixando os demais entregues a sua própria condenação. Os seres humanos ao mesmo tempo, são seres livres e autodeterminantes, que devem responder a Deus num ato de obediência a Sua vontade revelada.

 

Ao mesmo tempo, que salientava o caráter científico da teologia, Scotus insistia que a teologia era prática, pois deveria levar o teólogo a amar a Deus.

Foi o primeiro teólogo que defendeu a imaculada concepção de Maria, isto é, Maria teria sido liberta do pecado desde a sua concepção e não após ela. Sua idéia se tornou dogma em 1854 pelo papa Pio IX.

 

Guilherme de Occam (1280-1349)

 

Nascido em Guildford, no condado de Surrey, estudou em Oxford, onde ingressou na ordem dos franciscanos. Idealizador do sistema nominalista como um todo. Occam dizia que os dogmas teológicos não eram demonstráveis racionalmente e que devia ser aceitos apenas com base na autoridade da Igreja. Ele separou fé e razão e negava a síntese tomista. Quanto aos universais ele defendia que só existiam a partir da elocubração do homem não possuindo existência objetiva por si só. Para ele o indivíduo tinha mais importância do que a instituição, essa crítica suscitou posteriormente o interesse de Lutero por sua obra. Depois de morto foi considerado herege pelo Concílio de Constança (1415).

 

Roger Bacon (1214-1292)

 

Pertencia a mesma tradição de Occam mas se dedicou aos experimentos científicos. Por isto foi ele quem colocou os fundamentos da ciência experimental que posteriormente foi desenvolvido por Francis Bacon no século XVII. Esta forma de chegar à verdade através da experimentação estava de acordo com os postulados do nominalismo.

 

TENDÊNCIAS DA ESCOLÁSTICA

 

 

REALISMO

REALISMO MODERADO

NOMINALISMO

Relação entre fé e razão

Eu creio a fim de que possa conhecer

Eu conheço a fim de que possa crer

Eu creio separado do que eu conheço

Natureza da Realidade

Universalia ante rem

Universalia in re

Universalia post rem

Personalidades

Anselmo

Tomás de Aquino e Abelardo

Guilherme de Ockham e Roscelino

Obras

Proslógio e monológio

Summa Theologiae

 

Proponentes Modernos

Evangelicalismo

Catolicismo Romano

Renascença e Iluminismo

 

Místicos Medievais

 

O misticismo medieval tinha suas origens na teologia agostiniana e na piedade monástica. Bernardo de Claraval foi o primeiro personagem medieval que desenvolveu o misticismo como posição teológica original. Meditações sobre o sofrimento de Cristo constituíam o centro do misticismo de Bernardo.

 

Não havia uma dicotomia entre escolástica e misticismo, frequentemente a contemplação formava a base da atividade escolástica. Um teólogo franciscano que combinou meditação e escolástica em alto grau foi Boaventura. Os temas teológicos que mais interessavam aos místicos eram aqueles que versavam sobre: Deus, os anjos, a alma do homem, e o significado dos sacramentos.

 

O principal místico medieval foi Meister Eckhart (1327), ele ensinou em Paris, Estrasburgo e Colônia. O mais notável de seus discípulos foi Jonh Tauler (1361) grande pregador em Estrasburgo, Colônia e Basiléia, teve o respeito até de protestantes. Henrique Suso (1366) e Jan van Ruysbroeck (1381) também pertencem a esse grupo.

 

Segundo Eckhart Cristo é o protótipo da união de Deus com o homem. Desta forma é o exemplo para todos os fiéis. O homem é salvo morrendo para o mundo e recolhendo-se dentro de si mesmo a ponto de unir-se com o divino. Isso acontece em três etapas: purificação, onde busca o arrependimento e a morte para o pecado; iluminação, que consiste na imitação dos sofrimentos e obediência de Cristo; união, a fase mais elevada onde o homem se livra das seduções do mundo e se une a Deus.

 

Um livro muito conhecido, escrito por um místico do final da idade média, é De Imitatione Christi, A Imitação de Cristo, de Tomás de Kempis. É um dos livros mais editados chegando a mais de 3000 edições.

 

Pré-Reformadores

 

Jonh Wycliffe (1328-1384)

 

Wycliffe estudou e ensinou em Oxford a maior parte de sua vida. Até 1378 dizia que a  Igreja Católica  deveria ser reformada pela expulsão de clérigos imorais e despojamento de suas propriedades que segundo eles eram a fonte da corrupção. Na obra Of Civil Dominium (Sobre o Senhorio Civil) ele defendia que os clérigos poderiam usar os bens mas não possuí-los. Falhas morais conforme Wycliffe eram suficientes para que a autoridade civil tomasse os bens dos clérigos e transferissem a outro.

 

A partir de 1378 ele começou a se opor aos dogmas da Igreja católica com idéias revolucionárias. Atacou a autoridade do papa, afirmou que a Bíblia e não a Igreja é a autoridade única para o cristão e que a igreja precisava se modelar segundo o padrão neotestamentário. Essa é a razão pela qual Wycliffe tornou a Bíblia acessível ao povo traduzindo-a para o inglês. Também se opôs ao dogma da transubstanciação defendendo apenas a presença espiritual de Cristo na Eucaristia. Também era contrário às indulgências e à idéia de que uma criança morta antes do batismo iria para o inferno.

 

Em 1382 sua idéias foram condenadas em Londres e foi obrigado a deixar seu pastorado. Por causa de sua relação com os nobres não sofreu nenhuma perseguição por parte da Igreja Católica. Depois de sua morte seu corpo foi exumado e queimado como herege pela inquisição. Seus seguidores, os lolardos, foram condenados à pena de morte por força da declaração: “De Haeretico Comburendo” promulgada pelo parlamento em 1401.

 

Jonh Huss (1373-1415)

 

Huss que estudara na Universidade de Praga e tornou-se seu reitor, adotou as idéias de Wycliffe e começou a propagá-las na Boêmia. Sua proposta de reforma provocou a inimizade do papa e este ordenou que Huss comparecesse ao Concílio de Constança para se interrogado. Huss contava com um salvo conduto do imperador que foi revogado enquanto estava preso em Constança. Como se recusasse a se retratar foi queimado na fogueira. Seus seguidores foram conhecidos como taboritas, se espalharam pela Boêmia e deram origem posteriormente a Igreja Morávia.

 

Humanismo

A teoria Humanista veio surgir somente no início do século XIV quando o italiano Francesco Petrarca (1304-1374) colocou o homem como centro de toda ação e como agente principal no processo de mudanças sociais. Essa posição de alguns pensadores causou impactos na Igreja. No entanto o humanismo em nenhum momento renegou o catolicismo. Humanistas como Petrarca eram religiosos, porém eram críticos da Igreja.

O pensamento Humanista baseou-se no antropocentrismo. Se antes Deus e a Igreja guiavam o Homem e seus passos, agora o Homem, por si só, obedecia a reflexão mais aprofundada para discenir seus caminhos. O pensamento Humanista fez ressurgir na cultura européia a filosofia greco-romana. Não obstante o grande avanço do pensamento Humanista, este restringiu-se à filosofia e à literatura, não englobando outros setores como as artes plásticas, por exemplo.

Erasmo de Rotterdam (1466-1536)

Erasmo, nascido em Rotterdam foi um teólogo e um humanista neerlandês.A informação sobre a sua família e sobre a sua juventude é vagamente referida nos seus escritos. Ele era quase seguramente filho ilegítimo. O seu pai foi um padre chamado Gerard. Sua educação ficou a cargo de uma série de mosteiros, e foi uma educação exemplar, a melhor possível a um jovem do seu tempo.

Foram-lhe oferecidas várias posições de honra e proveito através do mundo académico, mas ele declinou-as todas, preferindo a incerteza, tendo no entanto receitas suficientes da sua actividade literária independente.

A produtividade literária de Erasmo começou relativamente tarde na sua vida. Apenas quando ele dominou o Latim é que começou a escrever sobre grandes temas contemporâneos em Literatura e em Religião.

A sua revolta contra as formas de vida da igreja não resultou tanto de dúvidas quanto à verdade da doutrina tradicional, nem de alguma hostilidade para com a organização da Igreja. Sentiu antes a necessidade de aplicar os seus conhecimentos na purificação da doutrina e na liberalização das instituições do cristianismo.

Qquando da sua estadia em Inglaterra, Erasmo iniciou a examinação sistemática dos manuscritos do Novo Testamento, por forma a preparar uma nova edição e uma tradução para Latim. Esta edição foi publicada por Froben de Basiléia em 1516 e foi a base da maioria dos estudos científicos da Bíblia durante o período da Reforma.

Ele publicou uma edição crítica do Novo Testamento Grego em 1516 - Novum Instrumentum omne, diligenter ab Erasmo Rot. Recognitum et Emendatum. A edição incluiu uma tradução em Latim e anotações. Baseou-se também em manuscritos adicionais recentemente descobertos.

Erasmo tinha uma simpatia pelos pontos principais da crítica luterana à Igreja. Tinha um grande respeito pessoal por Martinho Lutero e Lutero sempre falava de Erasmo com reverência pelo seu conhecimento. Lutero esperava obter a sua cooperação num trabalho que parecia o resultado natural do seu próprio. Na sua troca de correpondência inicial, Lutero expressou uma intensa admiração por tudo o que Erasmo tinha feito pela causa de um cristianismo saudável e razoável e encorajou-o a unir-se ao movimento.

Erasmo declinou qualquer compromisso, argumentando que ao o fazer estaria a colocar em risco a sua posição como líder de um movimento por uma sabedoria pura, o que ele via como o objectivo de sua vida. Apenas como um académico independente poderia ele aspirar a influenciar a reforma da religião.

Tomas More (1478-1535)

Tomas More, ou latinizado em Thomas Morus foi homem de estado, diplomata, escritor, advogado e homem de leis, ocupou vários cargos públicos, e em especial, de 1529 a 1532, o cargo de "Lord Chancellor" (Chanceler do Reino - o primeiro leigo em vários séculos) de Henrique VIII da Inglaterra. É geralmente considerado como um dos grandes humanista do Renascimento..Era filho do juiz Sir John More, nomeado cavaleiro por Eduardo IV. More era homem de muito bom humor, caseiro e dedicado à família, muito próximo e amigo dos filhos. Dele se disse que era amigo de seus amigos, entre estes se encontravam os mais destacados humanistas de seu tempo, como Erasmo de Rotterdam e Luis Vives.

A sua obra mais famosa é "Utopia" (1516) (em grego, utopos = "em lugar nenhum") . Neste livro cria uma ilha-reino imaginária que alguns autores modernos viram como uma proposta idealizada de Estado e outros como sátira da Europa do século XVI. Um dos aspectos desta obra de More é que ela recorre à alegoria (como no Diálogo do conforto, ostensivamente uma conversa entre tio e sobrinho) ou está altamente estilizada, ou ambos, o que lhe abre um largo campo interpretativo .

De Morus teria dito Erasmo: "É um homem que vive com esmero a verdadeira piedade, sem a menor ponta de superstição. Tem horas fixas em que dirige a Deus suas orações, não com frases feitas, mas nascidas do mais profundo do coração. Quando conversa com os amigos sobre a vida futura, vê-se que fala com sinceridade e com as melhores esperanças. E assim é More também na Corte. Isto, para os que pensam que só há cristãos nos mosteiros."

Por ocasião da separação da Igreja Inglesa da Igreja católica Romana , Tomas More se nega a jurar favorável ao ato de supremacia de Henrique VIII. Neste ato o rei se colocava como o cabeça da Igreja Anglicana. Tomas more aceitava apenas Cristo como cabeça. More foi convocado, excepcionalmente, para fazer o juramento em 17 de abril de 1534, e, perante sua recusa, foi preso na Torre de Londres. O rei determinou o seu julgamento, sendo condenado à morte, e posteriormente executado em Tower Hill a 6 de Julho.

 

CAPÍTULO III – TEOLOGIA REFORMADA

 

 

1. Reforma Luterana

Lutero (1483-1546) nasceu em Eisleben, na Saxônia. Seu pai era proprietário de uma mina de cobre e deseja que seu filho fosse um advogado. Depois de seus estudos iniciais em Magdeburgo e Eisenach, Lutero ingressou no ano de 1501 na universidade de Erfurt, onde estudou na Faculdade de Artes e concluiu com sucesso seus exames de mestrado. Aprendeu filosofia aristotélica segundo a tradição nominalista que se opunha ao tomismo.

Depois de obter o grau de Mestre Lutero começou a estudar Direito e a lecionar ao mesmo tempo na Faculdade de Artes. Devido a promessa que fez quando quase foi atingido por um raio, ele abandonou a carreira a contragosto do pai e se tornou monge. Depois de dois anos foi ordenado sacerdote e estudou teologia de acordo com o programa do mosteiro.

Em 1510, Lutero foi enviado a Roma para tratar de assuntos referentes a sua ordem. Sofreu grande desilusão ao ver a degradação da cidade. Quando retornou mudou-se para Wittenberg onde o Eleitor Frederico da Saxônia organizara uma pequena universidade. Por insistência de Staupitz continuou a devotar-se ao estudo e a pregação tornando-se no ano seguinte Doutor em teologia.

Nesse período Lutero passou por uma crise espiritual  que não podia ser satisfeita pelas penitências. Ele tinha dúvidas se seria ou não um eleito de Deus por causa de suas tentações. Nesse estado Lutero recebeu ajudo de Staupitz que recomendou à Lutero que contemplasse o Cristo crucificado ao invés de se preocupar demasiadamente com a sua salvação.   

De 1513 a 1517,Lutero continuou a trabalhar no anonimato – ensinando , pregando e debatendo. Fez preleções sobre os Salmos, Romanos, Gálatas e Hebreus. Estes primeiros escritos prepararam o caminho para o aparecimento posterior de Lutero nos embates da Reforma.

As primeiras manifestações de Lutero alcançaram repercussão diminuta. Porém quando afixou as 95 teses contra as indulgências em 31 de outubro de 1517, acendeu o estopim que o levou ao rompimento com Roma.

O momento decisivo na vida de Lutero foi a descoberta que a justiça de Deus como descrita na Epístola aos Romanos não era uma justiça que julga e faz exigências, mas a justiça dada por Deus em graça. 

De 1519 a 1520 Lutero publicou seus trabalhos mais significativos: Preleções sobre Gálatas (1519); Tratado sobre as Boas Obras; Sobre a Liberdade do Cristão; Apelo à Nobreza Cristã da Nação Alemã e Sobre o Cativeiro Babilônico da Igreja (1520).

Tendo em vista sua oposição ao sistema de indulgências e sua publicações contra a Igreja Católica, Lutero foi excomungado pelo papa Leão X. Na Alemanha em alguns lugares seus livros foram queimados porém sem muita repercussão. Em 10 de dezembro de 1520, Lutero igualmente queimou a bula papal e outros livros romanistas selando o rompimento de vez.Diante do imperador Carlos V na Dieta de Worms, Lutero negou sua retratação diante de todos. A teologia de Lutero era irreconciliável com a Teologia Romana.

Teologia de Lutero

 - Interpretação das Escrituras: A teologia de Lutero é a teologia da Palavra. “E assim, a fé vem pela pregação e a pregação pela Palavra de Cristo”(Rm 10.17). Lutero reconhecia que a autoridade da Palavra era válida mesmo quando a tradição divergia dela; que a sua autoridade mantinha cativa a consciências. Também defendia que “a Escritura deve ser entendida a favor de Cristo, não contra Ele; sim, se não se refere a Ele não é verdadeira Escritura.” A Bíblia pode ser entendida por si mesma, agindo cada pessoa como seu próprio intérprete. As interpretações do clero ou tradição não são necessárias para a compreensão da Bíblia.

- Lei e Evangelho: caracterizam duas espécies de pregação, que agem simultaneamente. A Lei acusa e julga, enquanto o Evangelho suscita a fé no coração e a assim ergue o homem e o recria para que possa começar a amar a Deus e a seu próximo. Como conseqüência à pregação da lei e do Evangelho ocorre o arrependimento e confissão de pecados. A Palavra do perdão é proclamada pelo Evangelho, que desperta a fé na misericórdia e graça de Deus e transforma o homem de tal maneira que recebe nova mentalidade e o faz voltar seus olhos de si mesmo ao que Cristo é e faz.

- Doutrina da Justificação: de acordo com Lutero a justiça de Deus não é aquela julgada pelos homens mas perante Deus. Visto que o homem é pecador ela não pode ser alcançada pelo mérito humano. Essa justiça é adquirida pelo sofrimento e a morte de Cristo, e é atribuída ao homem pela fé, independentemente de qualquer mérito ou dignidade humana. Essa justificação ocorre quando quando o homem se humilha perante , reconhece que é pecador e clama por misericórdia e grã de Deus. Como dia o apóstolo Paulo:“concluímos que o homem é justificado pela fé, independentemente das obras da lei.” (Rm 3.28)

- Antropologia: segundo Lutero o pecado original significava corrupção real da natureza humana, abrangendo tanto o corpo como a alma, ou o homem inteiro. Com respeito à salvação ou bem-aventurança eterna, o homem está completamente sem livre arbítrio; é qualidade inteiramente divina, que só pode ser atribuída a Deus. Para ele a salvação depende exclusivamente da onipotente vontade divina da graça. 

- Doutrina da Graça e a Predestinação: graça significa o favor de deus ou amor de Deus ativo em benefício da salvação do homem. Conforme propõe em seu livro De servo arbítrio, o homem não está livre e é totalmente incapaz de contribuir para a sua própria salvação. Mas porque Deus que é responsável pela salvação não altera a vontade daqueles que se perdem? Lutero responde a essa questão da predestinação dizendo que essa pergunta não pode ser respondida; a resposta não foi revelada. (Deus absconditus)

- A doutrina de vocação em Lutero: vocação e criação andam juntas. É deus, com seu poder sustentador, que coloca os homens em suas diversas vocações e ofícios. As vocações seculares não são menos importantes que as religiosas. O objetivo da vocação é o de servir ao próximo. Quando o homem cumpre com aquilo que pertence a sua vocação, faz algo útil ao próximo, e Deus por seu intermédio revela bondade e providência. Desta forma Deus exerce sua influência tanto nos aspecto espiritual com no secular.

- O Conceito de Culto: o culto deveria manter uma rotina mas era importante que a Palavra fosse pregada. “Se a Palavra de Deus não for pregada seria melhor que o homen não cantassem ou lesse ou se reunisse”, disse Lutero em Sobre a Organização do Culto numa Congregação(1523). O conceito do sacrifício constante de Cristo na missa com como tendo o objetivo de satisfazer a Deus, foi substituído como uma oferta do próprio homem como sacrifício vivo a Deus. Jesus havia morrido uma vez por todas não havendo necessidade de repetição.  

- Sacramentos: Lutero reconheceu apenas dois sacramentos, o Batismo e a Ceia. O batismo expressa a participação do crente na morte e ressurreição de Cristo. Ele não acredita no poder regenerador da água isoladamente. Ele aceitou ainda o batismo infantil afirmando que a salvação obtida por Cristo também diz respeito às crianças. Sobre a Ceia, Lutero atacou a recusa do cálice aos leigos, a doutrina da transubstanciação e o sacrifício da missa. Apesar da rejeição à transubstanciação ele manteve a doutrina da presença real de Cristo na ceia defendendo a consubstanciação.

- Doutrina da Igreja: para Lutero a igreja não era a instituição externa governada pelo papa, mas a união dos fiéis produzida pelo Espírito Santo. Porém pode se falar da igreja em outro sentido como assembléia visível de pessoas que se reúnem num edifício especial. Nesse sentido a igreja possui regulamentos específicos, cargos,, ministérios e costumes. Todos os batizados e que foram atingidos pela pregação da Palavra fazem parte dessa cristandade exterior. Nela não se pode traçar uma linha demarcatória entre os que realmente crêem e os hipócritas.

 

2. Ulrico Zuínglio (1484-1531)

Foi o reformador mais importante da primeira geração da Reforma na Suíça.Foi o fundador da igreja de tradição reformada. Nasceu  em Wildaus de uma família de classe média. Seu temperamento se assemelhava mais a Melanchthon do que a Lutero. Zuínglio era um homem de compor¬tamento moderado.Foi influenciado plenamente pelo humanismo e o estudo sério de grego e dos país da igreja durante toda sua vida. Erasmo seu amigo, o inspirou em seu estudo do Novo Testamento e hermenêutica humanista. Foi mais amante da ética cristã que do estudo da doutrina.Em relação aos outros reformadores se identifica em sua posição de afirmar que as Sagradas Escrituras são a fonte principal e fundamental na teologia e vida do cristão.

Sua obra como líder na reforma suíça começou quando foi nomeado pároco em Zurique de 1519 até sua morte em 1531. A partir desse momento rompeu com a tradição eclesiástica ao não pregar mais os textos indicados no lecionário da igreja, preferindo a pregação de livro por livro e de tópicos na Bíblia.

Em 1522 vemos em seus escritos temas similares aos de Lutero contra as indulgências, o sistema penitencial, as peregrinações, o culto aos santos, a veneração à Maria, o celibato e o ascetismo monástico. Como preparação a um debate com o vigário geral de Constança escreve seus famosos Sessenta e sete artigos. Ali se destacam estes pontos principais: Jesus Cristo é único Salvador, a verdadeira igreja católica está composta de todos os crentes em Cristo, as Sagradas Escrituras são a única autoridade em questões de fé, boas obras são unicamente aquelas feitas por Cristo; e se condena uma série de práticas como o celibato, os jejuns e as vestimentas sacerdotais, etc. Ademais Zuínglio afirma que Deus é o único que nos absolve de todo pecado, pondo assim de lado a confissão individual.

Contudo, nesses artigos Zuínglio não foi muito claro quanto à obra de Cristo. É em seus escritos posteriores sobre a missa que define sua cristologia. Afirma então o sacrifício perfeito de Cristo na cruz, e condena a missa sacrificial romana. Ele destaca a Santa Ceia diferenciando-a das concepções romana (transubstanciação) e luterana (consubstanciação). Zuínglio prefere celebrar a presença espiritual de Cristo na comunidade durante esse ato memorial. Seus crítico vêem nisto uma postura neoplatônica onde a ressurreição corporal de Cristo não é completamente apreciada.

Baseado também no sacrifício completo de Cristo na cruz, Zuínglio critica aqueles que acreditam que as crianças não batizadas são condenadas. Aqui, sua visão dá valor universal da morte de Cristo. Ele admite uma posição quase universalista ao considerar possível a salvação de não cristãos como Sócrates na época pré-cristã. Zuínglio não via no batismo uma confirmação da fé cristã, e sim um sinal que marcava a entrada do cristão na comunidade de fé. Estas posições teológicas marcaram para Zuínglio uma controvérsia com Lutero sobre a presença real na Santa Ceia e com os anabatistas, por insistência destes em batizar de novo os crentes.

Concepções acerca da Ceia do Senhor

 

Transubstanciação

 

Católica Romana

Refere-se a transformação da substância do pão e do vinho no corpo e sangue de Jesus literalmente.

 

Consubstanciação

 

Luterana

Significa que Jesus se encontra presente COM a substância do pão e do vinho sem modificá-las / transformá-las.

 

Memorial

 

Zuíngliana

Entende que a presença de Cristo na Ceia é simbólica e memorial.

Zuínglio morre em um ataque de surpresa das cinco regiões católicas contra Zurique. Foi sucedido por Henrique Bullinger no comando da reforma em Zurique. Em alguns aspectos Zuínglio foi mais radical que Lutero; em outros, mais conservador. Ele rejeitou práticas medievais, mantendo somente o que podia ser aprovado pelas Escrituras. Em contrapartida ele não demonstrou a mesma genialidade que Lutero.

 

3. João Calvino (1509-1564)

 

João Calvino nasceu em Noyon, nordeste da França, no dia 10 de julho de 1509. Filho do secretário do bispo. Aos 12 anos, Calvino recebeu um benefício eclesiástico cuja renda serviu-lhe de bolsa de estudos.

 

Em 1523, Paris, estudou latim, humanidades e teologia. Em 1528, iniciou seus estudos jurídicos, primeiro em Orléans e depois em Bourges, onde também estudou grego. Com a morte do pai em 1532, publicou comentário sobre o tratado de Sêneca De Clementia.

 

Calvino converteu-se à fé evangélica por volta de 1533, provavelmente sob a influência do seu primo Robert Olivétan. No final daquele ano, teve de fugir de Paris sob acusação de ser o co-autor de um discurso simpático aos protestantes, proferido por Nicholas Cop, o reitor da universidade. No ano seguinte, voltou a Noyon e renunciou ao benefício eclesiástico. Escreveu o prefácio do Novo Testamento traduzido para o francês por Olivétan (1535).

 

Em 1536 escreveu a primeira edição das Institutas ou Tratado da Religião Cristã, contendo um apelo ao rei da França em favor dos protestantes perseguidos. Estando de passagem em Genebra foi convencido por Guilherme Farrel a ajudá-lo na reforma religiosa na cidade. A princípio recusou-se, porém depois da insistência de Farrel assentiu. No primeiro período em que iniciaram a reforma logo foram expulsos pelos líderes da cidade em 1538.

 

Calvino se exilou em Estrasburgo. Atuou como pastor, professor, participante de conferências e escritor. Produziu uma nova edição das Institutas (1539), o Comentário da Epístola aos Romanos, a Resposta a Sadoleto (uma apologia da fé reformada) e outras obras. Casou-se com a viúva Idelette de Bure (falecida em 1549).

 

Em 1541, Calvino retornou a Genebra a pedido dos governantes da cidade. Por catorze anos, enfrentou grandes lutas com as autoridades civis e algumas famílias influentes (os “libertinos”). Apesar de estar constantemente enfermo, desenvolveu intensa atividade como pastor, pregador, administrador, professor e escritor. Produziu comentários sobre quase toda a Bíblia.

 

Em 1555, os partidários de Calvino finalmente derrotaram os “libertinos.” Os conselhos municipais passaram a ser constituídos de homens que o apoiavam. A Academia de Genebra, embrião da futura universidade, foi inaugurada em 1559. Nesse mesmo ano, Calvino publicou a última edição das Institutas. O reformador faleceu aos 55 anos em 27 de maio de 1564.

 

Teologia de Calvino

 

Embora Calvino em alguns sentidos perpetuasse a tradição iniciada por Zuínglio e (notadamente no campo da organização eclesiástica), não podemos menosprezar o fato de Calvino considerar-se acima de tudo alguém que representava basicamente o mesmo ponto de vista que o mantido por Lutero. Mas tal como acontece com outros reformadores, a teologia de Calvino leva impressa uma marca diferente da de Lutero e também revela contribuições de outras fontes.

 

A idéia da glória de Deus ocupa lugar central na teologia de Calvino. Em sua opinião, a glória de Deus é o alvo de todos os planos de Deus para o mundo e para a salvação, bem como o da atividade humana. As vidas dos cristãos devem servir para aumentar a glória de Deus. Sujeição absoluta à vontade de Deus e obediência a sua lei são os fundamentos da fé calvinista. O cristão deve demonstrar sua fé, e ao mesmo tempo promover a glória de Deus, trabalhando laboriosamente na ocupação para a qual foi chamado, cooperando ativamente nas questões pertinentes ao reino de Deus.

 

Intimamente associada à idéia da glória de Deus (gloria Dei) na mente de Calvino estava a doutrina da providência de Deus (providentia Dei): tudo o que acontece é impelido pela vontade onipotente de Deus e por sua ativa cooperação.

 

Com isto chegamos na doutrina central do calvinismo a predestinação. Deste modo assim como todo curso do mundo se encontra sob a providência de Deus, assim também a salvação ou condenação de cada homem depende da vontade onipotente e predestinação de Deus. Alguns são predestinados à vida eterna, enquanto outros à condenação eterna.  E uma vez que o homem é criado para alcançar um alvo, dizemos que é predestinado à vida ou à morte.

 

Em relação ao problema do mal, Deus não é a fonte do mal, mas o emprega de modo secreto e inescrutável. Deus permanece justo mesmo quando rejeita alguém, mas esta justiça transcende todas as normas humanas.

 

A salvação do homem não se baseia no que ele próprio faz mas num decreto eterno. Em outras palavras, a dupla predestinação segundo o modo de pensar de Calvino (como de Agostinho) é a garantia final da salvação somente pela graça. O chamado e a justificação são sinais evidentes que se é um dos eleitos. De maneira correspondente, os rejeitados encontram um sinal de sua condição no fato que são excluídos do conhecimento de Cristo ou da santificação.

 

O conceito de predestinação de Calvino pressupõe uma justiça divina que vai além de tudo o que o homem concebe como justo. Mas Calvino ao mesmo tempo também afirmava que há uma conexão clara entre a justiça divina e a humana.

 

A tradição luterana difere da doutrina calvinista da predestinação na oposição ao conceito de dupla predestinação de Calvino, Lutero apontava às passagens bíblicas que falam do desejo universal de Deus de salvar, ou de reconciliar consigo o mundo inteiro. (Cf. 1 Tm 2.4; 1 Jo 2.2).

 

Calvino partia acima de tudo do princípio escriturístico: a teologia deve apresentar o que está registrado na Bíblia. Seu conceito de inspiração bíblica ele descrevia em termos de ditado feito pelo Espírito Santo, transmitido infalivelmente pêlos que escreveram as palavras da Escritura.

 

O Antigo Testamento tinha posição diferente para Calvino do que tom na teologia luterana. Calvino mantinha que o aspecto cerimonial da lei mosaica foi abolido com o aparecimento de Cristo. Mas, por outro lado, ensinava que a lei moral do Antigo Testamento se aplica também aos cristãos.

 

A piedade calvinista se caracteriza por rigorosa temperança e por trabalho árduo na vocação terrena. Esse tipo de vida tem sido chamado ascetismo mundano, que substituiu o ascetismo monástico medieval para os protestantes.

 

Para Calvino existia uma distinção entre igreja visível e invisível. Esta é composta pelos eleitos. A igreja visível é constituída por Palavra, sacramentos e disciplina eclesiástica. A organização congregacional deve seguir certas Instruções derivadas da Bíblia (inclusive os quatro ofícios: pastor, profes­sor, presbítero e diácono). A igreja tem também cuidadoso controle da moral e dos costumes. Espera-se que as autoridades seculares colaborem na manutenção da disciplina eclesiástica. Sua tarefa não é só a de manter a ordem pública mas também a de apoiar os inte­resses da verdadeira religião. Não se pensava em separação da Igreja do estado.

 

 Além da predestinação, a doutrina da cela do Senhor tem sido o ponto mais controverso entre o calvinismo e o luteranismo. Calvino de maneira alguma defendia um conceito puramente simbólico da ceia do Senhor. Para ele era realmente uma questão de participar do corpo e do sangue de Cristo, não com a presença literal do corpo de Cristo mas pela mediação do Espírito Santo.

 

5. Movimento Anabatista

 

Os anabatistas surgiram primeiro na Suíça em função da liberdade que existia neste país.  A insistência de Zuínglio na Bíblia como fundamento da ação dos pregadores encorajou a formação de conceitos anabatistas baseados na Bíblia. Os anabatistas (rebatizadores) eram assim chamados por não aceitarem o batismo infantil e batizarem novamente os adultos. Conrad Grebel (1498-1526) pode ser considerado como o fundador do movimento anabatista suíço. Membro de uma influente família nobre, recebeu uma excelente educação nas universidades de Viena e Paris. Depois de sua conversão em 1522, trabalhou ao lado de Zuínglio até romperem em 1525. Zuínglio ensinava que o batismo infantil não possuía base bíblica. Porém a eliminação do batismo civil trazia no seu bojo uma questão política. Uma criança não batizada não era considerada cidadã pois seu registro era feito pelas igrejas. Assim, Zwínglio desistiu da sua primitiva concepção da falta de fundamento bíblico para o batismo infantil. Em 1525 o Conselho de Zurique ordenou a Grebel e a Felix Manz, outro líder anabatista, que desistissem de promover seus ensinos. A revelia George Blaurock foi batizado por Grebel em 1527 e depois batizou Grebel e vários outros. Os anabatistas mais radicais que se opunham ao controle da religião pelo estado estavam pondo em perigo os seus esforços de convencer as autoridades conservadoras ainda indecisas a passarem para o lado da reforma. De início, Zwínglio usava a técnica do debate para persuadi-los a mudar de ideia, mas quando o método falhou, o conselho adotou medidas drásticas, como multas e exílio. Em 1526, o conselho decidiu punir com a morte por afogamento todos quantos esposassem os princípios anabatistas. Os anabatistas foram duramente perseguidos sendo quase extintos na cidade de Zurique em 1 531.

 

Balthasar Hubmaier (1481-1528), um dos.primeiros anabatistas alemães, de excelente educação, era doutor em teologia pela Universidade de Ingolstadt, onde foi aluno de John Eck, adversário de Lutero. Seu pastorado em Waldshut, perto da fronteira suíça, permitiu-lhe um contato com os radicais suíços cujas ideias adotou. Ele mais 300 seguidores foram batizados por efusão em 1525, pelo que teve de fugir para Zurique a fim de escapar das autoridades austríacas. Daí, foi para a Morávia, onde assumiu a liderança de todos que haviam fugido da perseguição de Zwínglio e dos milhares de moravianos convertidos às ideias anabatistas. Por ordem do Impera¬dor, foi queimado numa estaca em 1528, e sua esposa foi afogada no Danúbio pelas autoridades católicas romanas. Durante seu ministério como líder anabatista, ensi¬nou a separação entre Igreja e Estado, a autoridade da Bíblia e o batismo de crentes.'

 

O radicalismo de alguns grupos do movimento anabatista contribui para decepcionar muitos protestantes. A rebelião de Münster em 1535, liderada por alguns anabatistas revolucionários ou escatológicos, serviu para distanciar os anabatistas de Lutero e de seus seguidores.

 

Bernhard Rothmann, um dos cônegos da catedral de Münster, empenhou em converter Münster à fé luterana. Em 1532, o conselho autorizou o uso dos púlpitos pelos ministros luteranos, mas o Imperador ordenou ao bispo de Münster que expulsasse Rothmann e seus seguidores, os quais estavam se tornando muito radicais adotando ideias anabatistas de socialismo e propondo a venda das propriedades para ajudar os pobres.

 

Em 1533, vindo de Estrasburgo, Melchior Hoffman que acreditava que o milênio estava próximo assumiu o grupo sendo substituído posteriormente por Jann Matthys. Esses anabatistas foram conhecidos como escatológicos pois acreditavam que o milênio seria implantado naqueles dias. Mathys se proclamou Enoque e enviou emissários à Münster em 1534. Profetizou que seria a Nova Jerusalém. Depois, de embates com católicos e sucessivas trocas de líderes, os anabatistas escatológicos adotaram práticas estranhas como: a poligamia, a comunhão de bens e a antecipação doentia da vinda do reino dos céus. Houve desordem e uma carnificina desacreditando cada vez mais o movimento. O repúdio às idéias de Lutero e Zuínglio, além do fanático incidente de Münster, determinou a condenação e a perseguição ao movimento, tanto por parte dos protestantes como dos católicos romanos.

 

Menonitas

 

Outro tipo de anabatismo, muito mais equilibrado foi representado por  Meno Simons. (c. 1496-c.1561) na Holanda. Simons aceitara as idéias anabatistas e abandonara seu sacerdócio na Igreja Romana em 1536. Liderou o grupo de irmãos, assim chamados para evitar o estigma do nome anabatista.Depois de sua morte, os "irmãos" passaram a ser conhecidos como menonitas, conseguindo, finalmente, sua liberdade religiosa em 1676.

 

Os Radicais Místicos ou Espirituais

 

Muitos seguiram o nobre Kasper Schwenkfeld (1498-1561). Essas pessoas ti¬nham uma orientação mais para a experiência, eram inclinados ao misticismo e criam numa direção interior pelo Espírito Santo. Um pequeno grupo ainda existe na Pensilvânia. São os precursores dos amishs.

 

Radicais Socinianos Racionalistas

 

Os socinianos, precursores dos modernos Unitarianos, foi outro grupo radical Reforma. Suas ideias se desenvolveram na Itália. Lelio Sozzini (Socinus)(1525-1562) foi atraído ao anti-trinitarianismo pela morte do anti-trinitariano Servetus, em Genebra. Fausto Sozzini (1539-1604), seu sobrinho, mudou-se paia a Polónia permaneceu lá até sua morte desenvolvendo ali o socianismo. Não aceitvam a Trindade e a idéia de pecado original. Segundo eles a morte de Jesus na cruz não foi substitutiva, apenas serviu como exemplo de obediência a Deus.

 

Suas Doutrinas Distintivas

 

- Rejeição do batismo infantil e batismo somente de adultos convertidos. Isso requeria o rebatismo (daí se derivando o nome deles) daqueles que abandonavam outras seitas, e que tinham sido batizados na infância. Esse ponto doutrinário foi radicalizado na forma da convicção de muitos anabatistas de que somente seu grupo era detentor da verdade, e que os membros de outros grupos (incluindo os protestantes) eram pessoas perdidas.

 

- Comunidade de bens e de propriedades, como característica constante. Portanto, praticavam uma espécie de comunismo teocrático.

 

- A maioria dos anabatislas tinha um conceito não-trinitariano de Deus, e uma noção marcionita (docética) da encarnação. Assim, eles negavam tanto a divindade quanto a humanidade de Jesus Cristo. Cristo, não sendo o verdadeiro Deus, de acordo com esse ponto de vista, também não era verdadeiro homem, pois Sua humanidade era apenas aparente. O docetismo é nome derivado do grego doken, «parecer». Muitos anabatistas eram antitrinitarianos declarados.

 

- Liberdade religiosa e separação entre a Igreja e o estado.

 

- Pacifismo, estrita disciplina eclesiástica, prática dos princípios do sermão do monte, reconhecimento e prática da lei do amor.

 

- Forte ênfase missionária, pois criam que cada crente tem o dever de ser uma testemunha.

 

- Ênfase sobre o dom profético, que algumas vezes levava a muitos cismas. Ressaltavam a palavra interna, e não a palavra externa (as Escrituras). Isso debilitava entre eles a autoridade da Palavra escrita e permitia um excessivo individualismo.

 

- Negação de doutrinas como a total depravação do homem, o pecado original, a eleição e a condenação eterna. Muitos deles eram universalistas. Enfatizavam a capacidade do homem buscar e achar a Deus diretamente, no nível da alma. Portanto, havia um forte elemento místico na fé deles.

 

6. Reforma Anglicana

 

A reforma inglesa foi diferente daquelas que ocorreram em outros lugares por causa do envolvimento direto de seus governantes.Desde o século XII estava se formando na Inglaterra uma igreja estatal e nacional, com a tendência de eliminar a influência romana em sua vida. Os Decretos Parlamen-tares de 1343, de 1351 e 1553 declaram ilegítimas as nomeações papais e vetaram, com castigos gravíssimos, a introdução de bulas papais, sentenças e reservas. Sob o rei Eduardo III, o Parlamento proibiu, de uma vez por todas, o pagamento do imposto cobrado pela Santa Sé. A Igreja inglesa estava unida à de Roma, mas numa independência quase que total.

 

João Wycliff (1320-1384), sacerdote, estimado professor de teologia e filosofia em Oxford, não só aprovou as decisões de independência frente à Igreja romana, mas foi muito além: desejava uma verdadeira reforma. Afirmava que o poder temporal e as riquezas eram a ruína da Igreja. Melhor entregar tudo ao Estado e ser uma Igreja pobre.

Negou a existência do Papado, da hierarquia, das ordens monásticas e da tradição, o culto dos santos, relíquias e imagens e as missas pelos defuntos. Admitia apenas os sacramentos do batismo e da eucaristia. Mas, tendo convocado os pobres a uma revolta contra os poderosos, perdeu o apoio oficial. Wycliff permaneceu no ofício de pároco até sua morte. Estavam lançadas as sementes da reforma de dois séculos depois!

 

Por ocasião da reforma luterana, o rei inglês Henrique VIII (1509-1547) confirmou sua fidelidade à doutrina católica, mas, o pedido de anulação de seu casamento com Catarina de Aragão, negado pelo Papa, levou-o definitivamente a formar uma Igreja nacional. Quando o papa Clemente VII negou a possibilidade de o rei casar-se com Ana Bolena, em 1531, numa assembléia geral do clero, Henrique VIII fez-se proclamar chefe da Igreja Anglicana, “nos limites da lei de Cristo”, isto é, sem negar a união com Roma. Sendo excomungado, em 3 de novembro de 1533, o Parlamento aprovou o Ato de Supremacia que atribuía ao soberano os mesmos direitos sobre a Igreja da Inglaterra de que gozava o Sumo Pontífice. Era a ruptura total com a Igreja Católica Romana.

 

Nesse panorama, deu-se início a reorganização da Igreja inglesa: negou-se o primado papal, aboliu-se a lei do celibato e dos votos monásticos. Na liturgia adotou-se a língua inglesa e, ao mesmo tempo, foram condenadas algumas doutrinas protestantes. A Igreja Anglicana conservou a sucessão apostólica do episcopado .

 

No reinado de Eduardo VI (1547-1553), foram adotadas posições doutrinárias reformadas, negando o caráter sacrifical da Missa e a transubstanciação. No reinado de Elizabete I (1558-1603): por conta das tensões entre as facções ela adota a via media, um meio termo entre o catolicismo e o protestantismo.

 

A Reforma Anglicana é muito importante porque a Inglaterra teve enorme influência no protestantismo mundial.Na tradição anglicana destacamos dois teólogos: Thomas Cranmer e Richard Hooker.

 

Cranmer prefaciou e mandou distribuir a primeira Bíblia impressa em todas as igrejas. Foi autor dos dois documentos básicos do anglicanismo – o Livro de Oração Comum (1549,1552) e os Quarenta e dois Artigos (1553). Suas principais influências foram a luterana e reformada. Cranmer procurou manter o equilíbrio entre a autoridade suprema das Escrituras e o respeito pela tradição cristã antiga. Defendeu a salvação pela fé mas enfatizou a importância da santificação através das boas obras. Possui um conceito de sacramento semelhante ao de Calvino.

 

Hooker recebeu uma educação reformada tendo se convertido ao anglicanismo na Universidade de Oxford. Desenvolveu as idéias de Cranmer favoráveis ao tradicionalismo. Aceitou a idéia católica ortodoxa de que os sacramentos unem a pessoa a Deus. Defendeu um clericalismo semelhante ao católico romano. Fortaleceu os laços entre igreja e estado e tinha uma atitude tolerante com o catolicismo.

 

7. Reforma Católica

 

A Igreja Católica Romana reagiu contra a reforma protestante. Paulo III com justiça pode ser considerado o papa da transição do período renascentista para o da reforma católica. Ele convocou o concílio de Trento, neste foram discutidas cada doutrina romana questionada pelos reformadores. Temas como Escrituras, autoridade papal, justificação,  pecado  original,  graça e obras, sacramentos, a missa, o purgatório,  tiveram um tratamento especial. Nesse concílio as violações da disciplina que haviam contribuído para o advento da Reforma foram denunciados e penas severas foram aprovadas para tais desvios.Dois cardeais que presidiram sessões posteriormente tornaram-se papas, Julio III (1550-1555) e Marcelo II (1555). O papa Pio IV encerrou solenemente o concílio criando a instituição da Sagrada Congregação para que reforçasse e interpretasse autenticamente os decretos do concílio. Ele também publicou um índice de Livros Proibidos.

 

Houve uma série de importantes mudanças como: reforma do breviário católico romano, a introdução do catecismo Tridentino, a reforma do calendário Juliano, a instituição dos Colégios Romanos, a reorganização da Cúria, formação do corpo coletivo de oficiais, repressão ao banditismo, a Instituição de novas ordens, incluindo os jesuítas, capuchinhos, teatinos, e várias  comunidades femininas. Também houve a renovação da instrução nas academias, seminários, tanto religiosas como secular-religiosas.

 

Porém as atividades da Inquisição foram reavivadas especialmente na Espanha e na Itália. Infelizmente, essa reforma católica matou e queimou na fogueira milhões de pessoas para que os povos se mantivessem dentro dos limites da fé oficial aprovada.

 

8  Ortodoxia Luterana

 

A corrente surgida imediatamente após a reforma Luterana é conhecida com o nome de ortodoxia. As doutrinas formuladas nesse período formam o sistema clássico do pensamento protestante.Toda a teologia atual depende, de um ou de outro modo, dos sistemas clássicos da ortodoxia.

 

A teologia ortodoxa teve também importância política, uma vez que era necessário definir o status da religião, na atmosfera política do período imediatamente depois da Reforma. Foi nesse período, que se prepararam as Guerras dos Trinta Anos. Sob o imperador alemão, cada território tinha que definir precisamente o que acreditava, coisa básica para ser reconhecido, legalmente, dentro da unidade do Sacro Império Romano Germânico. A teologia, além disso, era uma teologia dos príncipes territoriais. Queriam saber de suas faculdades de teologia o que exatamente, se esperava da pregação e ensino dos ministros.

 

Razão e revelação

 

Vamos considerar, agora, os princípios do pensamento ortodoxo. Entre os principais, encontra-se a relação com a filosofia, assunto bastante debatido no protestantismo. Lutero, dizem, não estava muito inclinado a aceitar qualquer coisa que viesse da razão. Na realidade, não era assim. É verdade que se referiu, muitas vezes, contra os filósofos, até 'mesmo com desprezo e fúria, mas tinha em mente os escolásticos, em geral, e seu mestre, Aristóteles. Mas nas famosas palavras pronunciadas, na Dieta de Worms, afirmou que não voltaria atrás a não ser que fosse refutado pelas Santas Escrituras ou pela razão. Lutero não era irracionalista. Rebelava-se contra quaisquer tentativas de transformação da substância da fé pelas categorias da razão. A razão não poderia salvar ninguém; ela precisava ser salva.

 

Princípio formal e princípio material

A ortodoxia protestante desenvolveu dois princípios teológicos, o formal e o material. O princípio formal é a Bíblia; o material, a doutrina da justificação. Segundo Lutero, são interdependentes. As passagens que tratam de Cristo, na Bíblia, são as que apresentam a mensagem da justificação, e é isso que é autêntico. Por outro lado, essa doutrina é tomada da Bíblia e, portanto, dela depende. Segundo a ortodoxia os dois princípios não se misturavam. E assim, a Bíblia se tornava o verdadeiro princípio no domínio da autoridade.

 

Que pensava a ortodoxia sobre a Bíblia? A autoridade da Bíblia mantinha-se de três modos: (1) por meio de critérios externos, como época, milagres; profecia, mártires etc.; (2) por meio de critérios internos, como estilo, idéias sublimes, santidade moral; (3) e pelo testemunho do Espírito Santo.

 

A Ortodoxia Luterana teve aspectos positivos, como a erudição bíblica, a ênfase pastoral e o fato de manter viva a herança luterana. Todavia, de um modo geral o intelectualismo e o formalismo que ela estimulou foram prejudiciais para a fé, produzindo frieza espiritual, moral e teológica.

 

9.Puritanismo

 

Após a Reforma Anglicana havia uma preocupação por parte dos crentes de que a Reforma não houvesse se estendido o suficiente. Os Reis da Inglaterra tinham controle sobre a Igreja e podiam tolerar que houvesse uma reforma dentro dela, mas não queriam permitir um distanciamento do que consideravam tradição cristã. O receio deles era que se a Igreja se reformasse totalmente, na Inglaterra e na Escócia, eles perderiam o poder.

É neste cenário que os Puritanos aparecem. Depois da Reforma, na Inglaterra e na Escócia seguiu-se um período de recessão e esfriamento.Havia um grande grupo na Inglaterra e na Escócia que tinha um desejo profundo de ver uma reforma completa na vida da Igreja. Essa vontade era controlada por aquilo que conhecemos como o princípio regulador do movimento Puritano. A idéia é esta: Tudo no culto deve ser regulado e controlado pela Palavra de Deus escrita. Para esse grupo, aqueles acréscimos humanos ao culto, que não podiam ser demonstrados nem apoiados pela Escritura, deviam ser tirados. Esse grupo não queria que se permitisse o acréscimo cada vez maior de tradições humanas no culto, pois isso quebraria o segundo mandamento, obscureceria a clareza do Evangelho e impediria que o poder de Deus viesse sobre a Igreja. Por causa desse desejo, vieram a ser chamados e conhecidos como Os Puritanos . A palavra vem do inglês e significa purificar . Examinando grande parte dos livros e afirmações a respeito dos puritanos — até pelos evangélicos — percebemos que seus autores tendem a ser criticados.De fato, o título “puritano” foi criado originalmente como um pejorativo, e muitos ainda o vêem assim.

O projeto puritano incluía a purificação da Igreja de Deus, especialmente o culto, através da Palavra de Deus escrita. Estavam interessados em purificar também, em segundo lugar, o governo da Igreja e depois a vida da família, o comércio, e os negócios.

Segundo Mark Johnston o legado dos puritanos pode ser dividido em cinco ênfases principais.

- A opinião a respeito de Deus. Tudo em que os puritanos criam originava-se de sua opinião a respeito de Deus. Isto é ilustrado pelo fato de que o primeiro apelido depreciativo vinculado a esses homens foi “os precisos” ou “os precisionistas”. Quando um nobre perguntou a Richard Rogers (um ministro em Wetherfield, Essex) o que o tornava tão preciso, ele respondeu: “Senhor, eu sirvo a um Deus preciso”.

- A estima das Escrituras. Essa consideração das Escrituras é expressa com concisão na Pergunta 2, do Breve Catecismo de Westminster: Que norma Deus nos tem dado a respeito de como podemos glorificá-Lo e desfrutar dEle? Resposta: a Palavra de Deus, contida nas Escrituras do Antigo e Novo testamento, é uma norma verdadeira para nos guiar em como podemos glorificá-Lo e desfrutar dEle. Ao fazer esta afirmação e colocá-la em seu catecismo, os puritanos estavam apenas reiterando o princípio Sola Scriptura, que estava no âmago da Reforma Protestante, e protegendo a essência tanto do evangelho como da igreja.

- O entendimento da salvação. Thomas Manton nos dá um vislumbre do entendimento bem estruturado da doutrina da salvação, um entendimento que era característico de seus colegas puritanos e moldava a opinião deles sobre o evangelho: “O resumo do evangelho é isto: todos aqueles que, por meio de arrependimento e fé, abandonarem a carne, o mundo e o diabo, entregando-se ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, como seu Criador, Redentor e Santificador, encontrarão a Deus como o Pai que os recebe como filhos reconciliados, que perdoa os seus pecados, por amor a Jesus, e lhes dá graça, por meio de seu Espírito. E, se perseverarem neste caminho, Ele os glorificará no final e lhes outorgará a felicidade eterna”.Este entendimento amplo da salvação explica o uso que os puritanos faziam do termo “regeneração” e sua riquíssima compreensão do evangelismo.

- A apreciação da Igreja. Se existe um elemento que pode ser identificado como o principal catalizador para o surgimento dos puritanos, esse elemento era a preocupação deles com a reforma da igreja. Eles tinham um conceito elevado da igreja. Isto começou a se tornar evidente no criticismo deles em relação aos decretos religiosos de Elizabeth.Muitos dos puritanos jovens eram graduados de Cambridge e entraram no ministério da Igreja Anglicana a fim de pressionar por uma reforma permanente que afetaria cada igreja local.

- A preocupação pelo mundo como um todo. O quinto distintivo digno de ser ressaltado a respeito dos puritanos é o ponto de vista deles sobre a vida e a comunidade como uma unidade integrada. Os puritanos criam que Deus havia sancionado a vida solidária na sociedade. Isso se refletiu nos ousados (mas imperfeitos) esforços deles na esfera política, alcançando seu zênite na Revolução Gloriosa e no estabelecimento do Commonwealth. Embora os puritanos diferissem quanto à natureza do relacionamento entre a Igreja e o Estado, eles sustentavam a convicção de que a igreja tinha um papel, dado por Deus, em referência à vida da comunidade como um todo, um papel que ia além da necessidade de evangelismo.

 

Capítulo IV - Teologia no Período Moderno e Contemporâneo

 

1. Pietismo

 

Como um movimento organizado, o pietismo teve início entre os luteranos da Alemanha, nos fins do século XVII, associado principalmente a Philipp Jakob Spener, acerca de quem damos um artigo separado. A corrente principal do luteranismo tornara-se rígida em suas doutrinas e morta no sacramentalismo. Outrossim, o calvinismo caiu no legalismo dogmático. Spener cria que a ênfase original da Reforma Protestante, sobre a conversão pessoal, a santificação e a experiência religiosa tinha-se perdido essencialmente, o que justifica o seu protesto e o movimento que daí resultou. Ele servia como pastor em Frankfurt, mas a sua mensagem não tardou a espalhar-se por toda a Alemanha, e daí para outros países. O mais notável discípulo de Spener foi August Hermann Franke. Ele foi um bem sucedido professor e obreiro cristão. Tinha organizado escolas para os pobres, um orfanato, uma casa publicadora e outras obras de caridade; e, segundo a história informa-nos, era combatido por ministros e teólogos invejosos.

 

Ênfases Principais

 

A necessidade de experiências religiosas pessoais; o valor do misticismo; a necessidade de uma conversão que realmente mudasse a vida do indivíduo, e uma santificação que continuasse esse processo; um desprezo relativo aos credos; a retidão pessoal; a necessidade de renunciar ao mundo e suas atrações; a fraternidade universal dos crentes; o calor emocional na religião cristã.

 

2. Jonh Wesley(1703-1791)

John Wesley nasceu em Epworth, Inglaterra, foi um clérigo anglicano e teólogo britânico, líder precursor do movimento metodista. John Wesley viveu na Inglaterra do século XVIII, uma sociedade conturbada pela Revolução Industrial, onde crescia muito o número de desempregados.

Jonh Wesley iniciou seus estudos em Oxford onde começa a se reunir com um grupo de estudantes para meditação bíblica e oração, sendo conhecidos pelos colegas universitários de "Clube Santo", ele não inventou o nome: alunos, notando que os membros do grupo tinham horário e método para tudo que faziam, os taxaram como 'metodistas'. Neste grupo Wesley e seu irmão Carlos iniciaram a visitar e evangelizar os presídios. Wesley passou então a se interessar mais pela questão social de seu país e a miséria que a Inglaterra vivia na época.

Aos 32 anos, quando atendeu a um apelo: precisava-se de missionários na Virgínia, Nova Inglaterra. Um dos episódios que marcou o início do metodismo foi a viagem missionária de Jonh Wesley aos EUA - Virgínia para "evangelizar os índios" sendo praticamente fracassado. Durante o seu retorno à Inglaterra irrompeu uma grande uma, Wesley ficou profundamente impressionado com um grupo de morávios (grupo de cristãos de origem pietistas) a bordo do navio. A fé que tinham diante do risco da morte predispôs Wesley à fé evangélica dos pietistas. Retornou à Inglaterra em 1738.

Após 2 anos, John Wesley volta desiludido com o trabalho realizado na Virgínia. Encontra-se, então, com Pedro Böhler, em Londres, Böhler era pastor moraviano (da Morávia, Alemanha) e com ele John Wesley se convence de que a fé é uma experiência total da vida humana. Procurou, então, libertar-se da religião formalista e fria para viver, na prática, os ensinos de Jesus.

No dia 24 de maio de 1738, numa pequena reunião, ouvindo a leitura de um antigo comentário escrito por Martinho Lutero, pai da Reforma Protestante, sobre a carta aos Romanos, John sente seu coração se aquecer. Experimenta grande confiança em Cristo e recebe a segurança de que Deus havia perdoado seus pecados. Essa experiência é narrada em seu diária assim:

"Cerca das nove menos um quarto, enquanto ouvia a descrição que Lutero fazia sobre a mudança que Deus opera no coração através da fé em Cristo, senti que meu coração ardia de maneira estranha. Senti que, em verdade, eu confiava somente em Cristo para a salvação e que uma certeza me foi dada de que Ele havia tirado meus pecados, em verdade meus, e que me havia salvo da lei do pecado e da morte. Comecei a orar com todo meu poder por aqueles que, de uma maneira especial, me haviam perseguido e insultado. Então testifiquei diante de todos os presentes o que, pela primeira vez, sentia em meu coração".

Nos 50 anos seguintes, Wesley pregou em média de três sermões por dia; a maior parte ao ar livre. Houve uma vez que pregou a cerca de 14.000 pessoas. Milhares saíram da miséria e imoralidade e cantaram a nova fé nas palavras dos hinos de Carlos Wesley, irmão de John. Os dois irmãos deram à religião um novo espírito de alegria e piedade.

Como não havia muitas oportunidades na Igreja Anglicana, Wesley pregava aos operários em praças e salões - muito embora ele não gostasse de pregar fora da Igreja - E tornou-se conhecidíssima esta sua frase: "o mundo é a minha paróquia". Influenciados pelos moravianos, John e seu irmão Carlos organizaram pequenas sociedades e classes dentro da Igreja da Inglaterra, liderados por leigos, com os objetivos de compartilhar, estudar a Bíblia, orar e pregar. Logo o trabalho de sociedades e classes seria difundido em vários países, especialmente nos EUA e na Inglaterra e estaria presente em centenas de sociedades, com milhares de integrantes. Com tanto serviço, Wesley andava por toda a parte a cavalo, conquistando o apelido de 'O Cavaleiro de Deus'. Calcula-se que, em 50 anos, Wesley tenha percorrido 175 mil quilômetros e pregado 40 mil sermões, com uma média de 800 sermões por ano. A Igreja Metodista, como Igreja propriamente, organizou-se primeiro nos EUA e depois na Inglaterra (somente após a morte de Wesley no dia 22 de março de 1791).

Teologia de Wesley

 

A maior força da doutrina wesleyana talvez esteja em sua habilidade de mobilizar os cristãos a buscarem um futuro mais perfeito que supere o presente. Wesley é chamado de teólogo da prática. Sua teologia não está cega as às forças negativas do ser, no entanto não as consideram conseqüências inevitáveis do pecado original, mas exatamente aquilo que pode ser vencido.

 

Wesley ensina que Deus não apenas justifica, mas que o objetivo de Deus é nos criar novamente, transformar-nos, restaurar-nos a saúde e o nosso papel como imagem Sua.

Esta teologia busca o poder criativo e transformador na vida neste mundo. Busca transformação no aqui-e-agora. É assim que a criatura deve glorificar o criador

Três fatores indispensáveis na Regeneração: Graça, que é a iniciativa divina de renovar a criatura e o mundo. Fé, a resposta humana à capacitação que reconstitui a imagem relacional. Sinergia, a imagem renovada agindo em consonância com o Criador para partilhar seu poder renovador com o mundo.

 

O objetivo de Deus não é meramente nos revestir de uma justiça que permanece exterior a nós mesmos, mas conceder e implantar a justiça de Cristo em nós de tal modo que ela cresça e se expanda. A justiça do cristão não é de sua própria feitura, não é inerente, mas produto do Espírito de Cristo.

 

O que diferencia a teologia de Wesley é sua capacidade de manter unidos, numa associação funcional, dois fatores absolutamente importantes na vida cristã que, muitas vezes, têm estado desassociados: a renovação desta relação (justificação) e a vivência dela (santificação), nenhuma das quais é possível sem a outra.

 

Wesley entende que o amor é o supremo alvo do processo de santificação. Quando os céus e a terra tiverem passado, ele permanecerá ainda. Porque só “o amor jamais acaba”. Gálatas 5.6. “A fé que atua pelo amor” é o comprimento, a largura, a profundidade e a altura da perfeição cristã”. E ele nunca se cansava de lembrar a seus leitores que a perfeição, do modo como a compreendia, não é nada mais nada menos que “amar a Deus de todo o coração e ao próximo como a nós mesmos”.

 

No entanto, como imagem de Deus, somos chamados não apenas a receber, mas a refletir esse amor perfeito ao mundo. Nossa santificação está associada e voltada à santificação do mundo, e como tal é um projeto sempre sinalizador e nunca acabado, muito embora o amor que redirecionamos seja completo, já que sua origem é divina.

 

A renovação da imagem também nos ajuda a explicar como a santificação é um processo que começa com o novo nascimento da regeneração, mas continua em direção à plenitude da perfeição, com possibilidades cada vez maiores de refletir a perfeição do amor divino, expulsando o pecado e renovando a criatura e o mundo.

 

3. Liberalismo Teológico

 

Durante dois séculos, os pensadores protestantes sustentaram uma cosmovisão cristã básica apoiada nas Escrituras e nos grandes credos cristãos históricos. Com o advento da modernidade, a razão e a ciência foram colocadas em pé de igualdade ou mesmo acima das Escrituras e da tradição. Surgiram duas opções para os pensadores influenciados pela nova mentalidade que queriam continuar cristãos: criar formas próprias de cristianismo (unitários) ou permanecer nas igrejas históricas e reinterpretar as doutrinas protestantes clássicas (liberais).

O termo "liberal" expressava a ênfase no direito do indivíduo de definir os termos da sua fé sem ser constrangido por nenhuma auto­ridade externa. O objetivo dessa nova teologia não era simplesmente negar certas crenças, mas transformar o pensamento cristão à luz da filosofia, da ciência e da erudição bíblica modernas.

 

Immanuel Kant

 

O maior pensador iluminista, e também o critico mais contundente do Iluminismo, foi o filósofo alemão Immanuel Kant. Ele expressou muitos temas essenciais desse movimento, mas ao mesmo tempo restringiu a razão a uma esfera mais limitada que os seus anteces­sores aceitariam. Em sua principal obra sobre a temática religiosa, A religião dentro dos limites da razão pura (1793), ele restringiu o cristianismo ao âmbito da ética, depreciando tanto a religião revelada quanto a religião natural. Para Kant, a religiosidade autêntica era viver de acordo com os deveres que podiam ser discernidos racionalmente; seu principal propósito era fornecer às pessoas fundamentos e instruções morais. Essa religião não-especulativa e não-sobrenatural não poderia entrar em conflito com a ciência. Mesmo assim, ele manteve a crença em Deus, na imortalidade da alma e nas retribuições morais após a morte.

 

Georg Hegel

 

Reagindo contra Kant, Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), outro grande filósofo alemão, procurou reintroduzir um forte conceito de Deus que não contrastasse com a mentalidade científica moderna. Em sua obra Preleções sobre a filosofia da religião (1840), ele explicou Deus como um Espírito (Geist) mundial imanente que está por trás da natureza, da história e da cultura, e com elas evolui. Deus e o mundo se pertencem e crescem juntos. Nessa visão otimista, a humanidade e a cultura humana representam Deus chegando à autoconsciência. A realidade não é estática, mas dinâmica, e se move por meio de uma dialética de tese, antítese e síntese, sempre procurando uma verdade mais plena. A filosofia hegeliana da história, segundo a qual a própria história é verdade dinâmica, deu grande impulso aos estudos históricos e teológicos em Tübingen, com hegelianos como Ferdinand C. Baur (1792-1860) e David F. Strauss (1808-1874).

Friedrich Schleiermacher

 

Até o início do século XIX, os teólogos protestantes europeus em geral se opunham à modernidade sempre que ela entrava em conflito com a ortodoxia. Esse cenário mudou com Friedrich Schleiermacher (1768-1834), considerado o pai da teologia liberal moderna. Ele foi o primeiro teólogo protestante a propor mudanças radicais na ortodoxia para se harmonizar com o espírito da modernidade. Schleiermacher escreveu uma obra que se tornou clássica — Sobre a religião: discursos aos seus menosprezadores cultos (1799). Insistiu em que a essência da religião não está em argumentos racionais, dogmas revelados, rituais eclesiásticos ou mes­mo na moralidade, mas num profundo sentimento (Gefühl) de total dependência de uma realidade infinita, de unidade com o Todo, e do senso de plenitude dela resultante.

 

Albrecht Ritschl

 

Um nome mais estreitamente ligado à teologia liberal protestante Albrecht Ritschl (1822-1889), que por muitos anos foi professor de Teologia Sistemática na Universidade de Gõttingen, na Alemanha. Ritschl buscou separar a teologia da ciência mediante duas estratégias: primeiro, argumentando que as proposições de ambas são totalmente diferentes (a ciência trata de fatos e a religião, de valores); segundo, afirmando que a essência do cristianismo é inteiramente compatível com cosmovisão moderna. A essência do cristianismo está no ideal de Jesus quanto ao "reino de Deus". Ser cristão é procurar estabelecer o reino de Deus na terra de modo relevante, racional e prático.Como Kant, Ritschl reduziu o cristianismo à moralidade.

 

Adolph von Harnack

 

Harnack foi o sucessor de Schleiermacher e Ritschl como líder do liberalismo teológico clássico. Escreveu a volumosa História do dogma (1886-1890), na qual tentou demonstrar a helenização do pensamento cristão antigo e apelou à redescoberta do evangelho simples de Jesus Cristo. Em sua obra O que é o cristianismo? (1901), sintetizou a essência da fé cristã em três grandes ideias apresentadas por Jesus: a vinda do reino de Deus (o governo de Deus no coração das pessoas); Deus como Pai e o valor infinito do ser humano ("a paternidade de Deus e a frater­nidade dos homens"), e a justiça centralizada no amor.

 

4. Fundamentalismo

Em muitas universidades cristãs, seminários e igrejas da Europa (e, posteriormente, nos Estados Unidos), as idéias racionalistas começaram a ganhar larga aceitação.Muitos teólogos passaram a afirmar a existência de Deus, mas negavam sua intervenção na História humana, quer através de revelação, quer através de milagres ou da providência.

Como resultado da invasão do racionalismo na teologia, chegou-se à conclusão de que o sobrenatural não invade a história. A história passou a ser vista como simplesmente uma relação natural de causas e efeitos. O conceito de que Deus se revela ao homem e de que intervém e atua na história humana foram excluídos. Como conseqüência, os relatos bíblicos envolvendo a atuação miraculosa de Deus na História, como a criação do mundo, os milagres de Moisés e os milagres de Jesus, passaram a ser desacreditados. Segundo esta linha de pensamento, já que milagres não existem, segue-se que esses relatos são fabricações do povo de Israel e, depois, da Igreja, que atribuiu a Jesus atos sobrenaturais que nunca aconteceram historicamente.

 A reação conservadora: surgimento do fundamentalismo cristão

O nome “fundamentalistas” foi cunhado para se referir aos pastores, presbíteros e professores conservadores americanos de todas as denominações históricas que se coligaram para defender a fé cristã da intrusão do liberalismo nos seus seminários e igrejas. O nome foi usado por três motivos. Primeiro, os conservadores insistiam que o liberalismo atacava determinadas doutrinas bíblicas que eram fundamentais do cristianismo e que, ao negá-las, transformava o cristianismo em outra religião, diferente do cristianismo bíblico.

Segundo, a publicação em 1910-1915 da série “Os fundamentos”, doze volumes de artigos escritos por conservadores que defendiam os pontos fundamentais do cristianismo e atacavam o modernismo, a teoria da evolução etc., dos quais foram publicadas 3 milhões de cópias e espalhadas pelos Estados Unidos. Há artigos de eruditos conservadores como J.G. Machen, John Murray, B.B. Warfield, R.A. Torrey, Campbell Morgan e outros.

Terceiro, a elaboração de uma lista dos pontos considerados fundamentais do cristianismo. Muito embora o conflito entre liberais e fundamentalistas envolvesse muito mais do que somente esses tópicos, citados abaixo, foram considerados na época pelos conservadores como os pontos fundamentais da fé e do cristianismo evangélico, tendo se tornado o slogan dos conservadores e a bandeira do movimento fundamentalista:

- A inspiração, infalibilidade e inerrância das Escrituras – reagindo contra os ataques do liberalismo que considerava que a Bíblia estava cheia de erros de todos os tipos.

- A divindade de Cristo – também negada pelos liberais, que insistiam que Jesus era apenas um homem divinizado.

- O nascimento virginal de Cristo e os milagres – para o liberalismo, milagres nunca existiram, eram construções mitológicas da Igreja primitiva.

- O sacrifício propiciatório de Cristo – para os liberais, Cristo havia morrido somente para dar o exemplo, nunca pelos pecados de ninguém.

- Sua ressurreição literal e física e seu retorno – ambas doutrinas eram negadas pelos liberais, que as consideravam como invenção mitológica da mente criativa dos primeiros cristãos.

Em 1920, o termo “fundamentalistas” foi empregado por conservadores batistas para designar todos aqueles que lutassem em favor destes cinco pontos. O uso se espalhou para todos, de todas as denominações afetadas pelo liberalismo que lutavam para preservar estas doutrinas fundamentais do cristianismo, e que se alinhavam teologicamente com o conteúdo da obra “Os fundamentos”.

 

 

 

Neo-Ortodoxia

 

Barth é considerado o teólogo mais destacado e influente do século XX. Alguns chegam a compará-lo ao reformador Martinho Lutero. Barth demonstrou que as promessas otimistas da teologia liberal haviam falhado, e que os homens tinham de buscar esperança nos antigos princípios religiosos. Visto que fora plenamente treinado no liberalismo alemão, tendo ficado desapontado com o sistema nazista, isso deve ter sido uma das razões pelas quais procurava e expunha uma nova ortodoxia.

 

Sua teologia tornou-se conhecida como neo-ortodoxia por estes motivos: 1. opunha-se a muitas posições liberais; 2. não acompanhava a ortodoxia tradicional quanto a várias questões. Para exemplificar, seus pontos de vista sobre as Escrituras demonstram respeito e um uso firme, embora considerasse a Bíblia eivada de erros e uma representante fragmentada da Palavra de Deus, que transcende a qualquer livro; porquanto essa Palavra consiste na comunicação de Deus na revelação, que se processa de muitas maneiras, e não apenas de forma literária.

 

Idéias Principais.

 

- O Deus transcendental. Deus seria inteiramente diferente do homem e nossa linguagem quando muito, é uma tentativa gaguejante de dizer algo acerca dele. Isso também se aplica às nossas declarações bíblicas.

 

- A verdade é um resultado da graça, e não da busca racionalista. Sabemos de Deus e de sua existência através da revelação, e não através de racionalizações. Em seus esforços para estabelecer esses princípios, Barth terminou criando uma teologia dialética.

 

- Aguda distinção é feita entre a revelação e a religião. A religião tem tendências nitidamente idólatras, mesmo às mãos de teólogos conservadores, que criam um Deus à sua própria imagem e transformam em ídolos as suas ideias e doutrinas. A revelação pode ser irracional ao homem, mas seus ensinos nos dão a entender tudo quanto sabemos sobre a verdade.

 

- A ênfase da Palavra de Deus, nas Escrituras e com base nelas, como autoritárias, em contraste com os outros meios de conhecimento religioso, racional e natural. Não se pode negligenciar a autoridade da Igreja, mas essa autoridade repousa sobre a autoridade da Palavra de Deus, no tocante à sua autenticidade; e, se ultrapassar isso, deve ser posta em dúvida.

 

Obras Principais de Barth. Epistle to the Romans, 1919; WordofGod and Word of Man, 1928; Anselm, 1931; Church Dogmatics, 4 volumes, 1923-1935; Credo, 1935; Dogmatics in Outline, 1947; Evangelical

6- Paul Tillich

Embora na obra de Paul Tillich encontramos ums sistema teológico que se relaciona com o barthianismo em alguns sentidos, apesar disso tem uma estrutura totalmente diversa. Era teólogo e filósofo da religião; o principal problema de que tratam seus livros é a relação entre teologia e filosofia, entre revelação e realidade empírica, bem como entre teologia e cultura.

De acordo com Tillich, aquilo que constitui nossa preocupação última é o objeto da teologia. A fim de determinar o que esta é, empregou a terminologia da antiga ontologia: nossa preocupação última é o que determina nosso «ser ou não ser». Deus, que é o «Ser em si», é a resposta às questões últimas do homem. A própria situação do homem é de alienação relativamente à realidade verdadeira. Mas uma vez que Deus ingressou na existência humana, deu ao homem a possibilidade de descobrir seu destino no Novo Ser, que se realiza em Cristo.

O sistema de Tillich se baseia, portanto em uma espécie de ontologia que, presume-se, dá a resposta absoluta às questões que os homens levantam como resultado de seu sentimento de alienação. A suposição que pergunta e resposta, sistema e análise existencial, relacionam-se mutuamente é a essência da abordagem metodológica que Tillich emprega. Sua sistema é chamado de Teologia da Correlação.

7- Rudolph Bultmann

Intenso debate teológico foi deflagrado em 1941 quando o  exegeta Rudolph Bultmann (professor em Marburgo) publicou um pequeno volume intitulado Neues Testament und Mythologie. O volume de Bultmann citado afirmava que a cosmovisão do Novo Testamento, com seu conceito de demônios e ações sobrenaturais, de milagres, da preexistência de Jesus, dos cataclismas dos últimos dias, etc., é incompatível com o conceito de realidade do homem moderno. Ele refere-se a esses elementos neotestamentários como sendo mitológicos. Como devem ser eles interpretados? Como deve o homem que ré cebeu uma educação moderna encará-los? Este é o problema, tal como Bultmann o formula.

De acordo com Bultmann, há exigência de desmitificação da Bíblia. Esses mitos devem ser interpretados de tal forma que digam algo sobre a existência humana. Devem ser interpretados antropologicamente, não cosmologicamente  — segundo o próprio Bultmann devem ser interpretados de maneira existencial. Já se tornou evidente que o programa de Bultmann contrasta flagrantemente com o da teologia liberal com suas tentativas de criar um retrato do Jesus histórico. Em outros aspectos, no entanto, Bultmann aproxima-se mais da tradição liberal. Isto se dá, por exemplo, com respeito a seu emprego do conceito de mito que, realmente, permanece obscuro em sua argumentação.

 

8- Teologia da Libertação

 

Dando ênfase à situação social e humana das populações desfavorecidas vítimas da injustiça social, a Teologia da Libertação propunha-se renovar, no amor a Deus, os laços da tradição cristã de solidariedade e de libertação dos oprimidos (especialmente as vítimas da opressão económica e social). Foi condenada pela Igreja Católica e várias protestantes pelo seu caráter politizado. O nascimento e o desenvolvimento da Teologia da Libertação na América Latina e no Caribe se deve basicamente a três fatores:

- Situação política, econômica e social do continente: A Teologia da Libertação foi gestada durante os regimes militares que governavam países do continente, durante os quais os problemas sociais se agravavam intensamente.

- O desenvolvimento do marxismo como instrumento de análise social: as ciências sociais, entre elas a análise marxista eram utilizados para compreender a origem das contradições da sociedade, embora, segundo Gonçalves, o marxismo não fosse utilizado como ferramenta para construção do projeto social alternativo.

- Mudanças no âmbito da Igreja Católica. Do ponto de vista católico, algumas mudanças na Igreja possibilitaram o surgimento da Teologia da Libertação:

a. A experiência da Ação Católica e seu método VER-JULGAR-AGIR. Esta pedagogia ajudou na busca de uma compreensão crítica da realidade e impulsionou uma ação transformadora.

b. A realização do Concílio Vaticano II, entre 1962-1965 e a busca de diálogo da Igreja com o mundo moderno.

c. A Segunda Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, em Medellín, Colômbia, ocorrida na vigência dos regimes militares.

d. O florescimento das Comunidades Eclesiais de Base, que impulsionadas pela Conferência de Medellín e pela pedagogia da Ação Católica através do método VER-JULGAR-AGIR, lutavam pela transformação social.

e. O enfrentamento dos regimes militares por parte dos bispos, quer através das conferências episcopais nacionais, quer por bispos isolados, como Dom Hélder Câmara, Dom Pedro Casaldáliga, Dom Paulo Evaristo Arns, Dom Oscar Romero, entre outros.

Foi a partir do engajamento de grupos e dos cristãos na luta pela transformação social que surgiu a Teologia da Libertação, como uma reflexão teórica destas experiências, retro alimentando este movimento de busca da mudança para uma sociedade mais igualitária.

Ao final dos anos 70 e início dos 80, a redemocratização das sociedades latino-americanas e caribenhas faz com que a Teologia da Libertação perdesse parte de sua combatividade política e social. Aliado a este fator, a queda do socialismo real e a crise da esquerda política fazem com que estes movimentos repensassem sua identidade.

 

Nascimento

A Teologia da Libertação nasceu da influência de três frentes de pensamento: o Evangelho Social das igrejas norte-americanas, trazido ao Brasil pelo missionário e teólogo presbiteriano Richard Shaull; a Teologia da Esperança, do teólogo reformado Jürgen Moltmann; e a teologia política que tinha como seus grandes expoentes o teólogo católico Johann Baptist Metz, na Europa, e o teólogo batista Harvey Cox, nos EUA.

Há uma série de eventos que precederam o nascimento da Teologia da Libertação:  o missionário presbiteriano Richard Shaull chega ao Brasil trazendo o Evangelho Social e cria uma estreita relação com os pastores presbiterianos Rubem Alves e Jaime Wright (1952); o teólogo reformado Jürgen Moltmann publica sua obra Teologia da Esperança(1964); o teólogo batista Harvey Cox publica A Cidade Secular(1967); o teólogo católico Johann Baptist Metz pronuncia a conferência Sobre a Teologia do Mundo(1967);

O marco do nascedouro da Teologia da Libertação está na publicação da obra Da Esperança, de Rubem Alves, que tinha o título de Teologia da Libertação, criticando a teologia metafísica de uma forma geral e propondo o nascimento de novas comunidades de cristãos animados por uma visão e por uma paixão pela libertação humana e cuja linguagem teológica se tornava histórica.

A primeira participação católica no lançamento da Teologia da Libertação foi a publicação da Teologia da Revolução, em 1970, pelo teólogo belga radicado no Brasil José Comblin. Em 1971, Gustavo Gutiérrez publicou Teologia da Libertação. Somente em 1972, Leonardo Boff surge no cenário teológico com a publicação de Jesus Cristo Libertador. Como Rubem Alves estava asilado nos EUA neste período, Boff passou a ser o mais conhecido representante desta corrente teológica que vivia no Brasil.

 

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JONHSTON, Mark – Apreciando o Caráter do Puritanismo in: Revista Fé para Hoje, Ed. Fiel, São Paulo, s/d

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