O Império Bizantino resumo
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O Império Bizantino resumo
O Império Bizantino (termo que apenas após a Idade Moderna passou a designar o que outrora se chamava de “Império Romano”, ainda que distinto do Antigo Império cuja capital fora Roma) foi a continuação directa do “ Antigo Império Romano” no Oriente, Império esse que se havia separado, definitivamente e em termos práticos, em duas partes após a morte de Teodósio (o último imperador que governou “em termos práticos” o Império unido) em 395 D.C.
Ainda que a distinção entre “Império Romano (do Ocidente)” e “Império Bizantino” seja algo relativamente recente a verdade é que, desde sempre, e mesmo no apogeu da Antiga Roma, as duas metades do Império sempre tiveram características distintas (algo nada surpreendente nem que fosse dado à magnitude do território ocupado pelo Império no seu apogeu), em particular no que tocava à organização territorial e à língua “franca” dos respectivos territórios.
Se o Ocidente do Império era nitidamente mais rural e a utilização do Latim predominava, a Leste o Império assumiu sempre uma face mais urbana, próspera, mercantil e o Grego (ainda que o Latim fosse a língua do Estado) era utilizado como língua franca por todo o território que, historicamente, havia estado sobre a esfera de influência cultural grega (expandida por todo aquele território antes sequer do nascer do Império Romano) há largos séculos.
A efectiva separação do Império – que jamais se reuniria apesar das várias tentativas de Bizâncio em controlar o Ocidente – em duas partes a 395 veio acentuar esta já antiga divergência cultural, a que se somava, agora, a completa alienação política entre os dois impérios. O Império Bizantino (assim como o Império Romano do Ocidente) também se distingue da Antiga Roma pelo facto de, desde a sua génese em 395, ter sido povoado por uma população essencialmente cristã, algo contrastante com o paganismo romano de Roma Antiga.
No entanto, e ao contrário do Império Romano do Ocidente, Bizâncio sobreviveria até à Idade Média, apenas caindo definitivamente com a conquista de Constantinopla pelos Turcos. Neste milénio que separa o nascimento do Império Bizantino da sua queda, Bizâncio atravessou várias fases. Durante séculos continuou – em todos os sentidos – o legado da Antiga Roma no Oriente; foi, indiscutivelmente, a “superpotência” mediterrânica durante um longo período de tempo, tendo mesmo, no reinado de Justiniano, reconquistado parte do território romano perdido no Ocidente às mãos dos invasores bárbaros, controlando grande parte da Itália dos dias de hoje e chegando mesmo a estender o seu território até à moderna fronteira entre Portugal e Espanha, no Algarve. Apenas cairia quase um milénio depois, incapaz de fazer frente à crescente e renascida força da Europa latina vinda de Oeste, aos povos eslavos vindos do Norte, aos poderosos califados egípcios do Sul, Persas do Leste e à derradeira ameaça selêucida turca, também vinda de Leste, que acabaria por ocupar, séculos mais tarde, precisamente o mesmo território que Bizâncio em tempos ocupara, e tomaria a capital bizantina.
O legado cultural bizantino ao mundo também não foi inferior ao de Roma Antiga: do ponto de vista religioso foi o berço da confissão ortodoxa cristã; o estilo arquitectónico Bizantino pesou não só no mundo europeu (com uma enorme influência em muitas das grandes obras do Renascimento Italiano, por exemplo) como também no mundo muçulmano; o mesmo pode ser dito acerca da sua arte; da matemática; da astronomia; e, de particular interesse para nós, desempenhou um papel fulcral na história do Direito, na qual Justiniano – Imperador a que já me referi anteriormente – se destacou.
Num esforço de síntese e de economização de tempo optei por debruçar-me sobre Justiniano e o seu papel no Direito, crendo eu ser este o tema que verdadeiramente nos interessa por detrás desta apresentação. É sobre Justiniano e as suas reformas legais que irei falar agora:
Petrus Sabbatius, que mais tarde assumiria o nome de “Justiniano”, nasceu numa família de posses modestas e de origem provavelmente trácia (nascendo, por isso, na parte do Império Romano do Oriente onde a língua utilizada era o Latim) em 481 no território que hoje pertence à República da Macedónia. Indiscutivelmente – tendo nascido numa zona “perdida” do Império e não sendo de origem grega, assim como sendo proveniente de uma família não aristocrata e de origens rústicas – ficou a dever a seu tio, Justino, o lugar que ocuparia mais tarde no seio do poder de Bizâncio. Justino, irmão da mãe de Justiniano, e também ele nascido na actual Macedónia, ascendera nas fileiras do exército bizantino e acabaria por ocupar um lugar de destaque dentro das forças imperiais: o de comandante da guarda imperial. Por não ter filhos acabaria por trazer os seus sobrinhos para a capital imperial e certificou-se de que estes recebiam uma boa educação: entre esses seus sobrinhos veio, pois, Justiniano.
Quando o imperador Anastácio morre em 518, Justino é aclamado imperador, apoiado pela Guarda Imperial. Auxiliando o novo imperador encontra-se Justiniano, que com a ascensão ao poder do tio sobe rapidamente na hierarquia político-militar bizantino, ao ponto de em 527 os senadores induzirem Justino a compartilhar o poder com o seu sobrinho, entretanto já cônsul. Por fim, no Verão desse mesmo ano, morre o Imperador Justino e Justiniano ascende ao cargo superior do Império.
Passados 5 anos após a sua proclamação como Imperador, Justiniano empreendeu o derradeiro golpe da estratégia de “consolidação” política: com a revolta de “Nika” vê-se livre dos seus mais agressivos opositores, e abatendo a insolência dos dois partidos político militares criados pelas facções do hipódromo (onde teve lugar a revolta) faz sentir a sua força e consolida o seu poder, encarregando um dos seus generais de confiança, Belisário, de intervir na situação. Da revolta resultam, de acordo com fontes da época, 30 mil mortos, todas vítimas da intervenção militar ordenada por Justiniano.
É também Belisário que dá início à política de “reconquista” justiniana (que por fim revelar-se-ia efémera e extremamente dispendiosa, tanto em custos humanos como matérias, para o Império), comandando as forças bizantinas que devolveriam Cartago a Bizâncio das mãos dos Vândalos. Após o estrondoso sucesso no Norte de África, Justiniano, aproveitando a crescente instabilidade política entre os Ostrogodos na Península Itálica, “amadurece” o projecto de restauração da unidade do Império Romano e dá ordens a Belisário para tomar Sicília que, por fim, chega até ao Norte de Itália, controlando a que fora a capital do Império Romano do Ocidente nos seus últimos dias – Ravenna. Ao mesmo tempo, a Oeste, Justiniano chega a controlar as zonas costeiras da Península Ibérica, e estabiliza as fronteiras orientais, na frente Persa, negociando a paz com estes. É assim que, aquando da sua morte a 565, Justiniano lega a Bizâncio cerca de metade do território que o Antigo Império Romano havia controlado no passado.
No entanto, ao passo que este domínio territorial revelar-se-ia efémero e de curta duração (a guerra nas fronteiras eram constante e cedo chegaram novos invasores às imediações do Império), o mesmo não pode ser dito sobre as outras grandes “conquistas” de Justiniano. Se a Basílica de Santa Sofia (Hagia Sofia), construída após as revoltas de Niko, foi a grande herança arquitectónica de Justiniano, o chamado “Corpus Juris Civilis” foi provavelmente o maior legado de Justiniano à civilização moderna, e, em particular, aos modernos estados continentais, que hoje possuem um Direito que foi moldado à imagem do Direito Romano.
O Direito Romano nem sempre teve características unitárias e nunca foi codificado. Só no seculo V se procede no Oriente a uma compilação dos materiais jurídicos romanos, quando o Imperio do Ocidente se encaminha para o declínio definitivo; mas essa compilação é extremamente parcelar, porque se restringe às leis imperiais promulgados de Constantino em diante. Justiniano, Imperador do Oriente, realiza, porém, no século VI, uma grande compilação que engloba leis e jurisprudência romana e transmite aos vindouros um património jurídico de inestimável valor, destinado a constituir durante seculos a base do direito vigente em muitos países europeus.
Assim, quando no início do século V Alarico invadiu e saqueou Roma, ainda não existia uma recolha oficial dos materiais jurídicos romanos. O Direito Romano sempre sobrevivera sem compilações oficiais o que, obviamente, lhe atribuiu uma grande incerteza que vinha a ser criticada há vários séculos, até mesmo na fase Republicana que antecedeu ao Império. Ainda assim, a partir do século III, colecções privadas (para uso das escolhas e dos operadores de direito) surgiram, como o Codex Gregorianus ou o Codex Hermogenianus. Fora dado (ainda que não oficialmente e sem ser sancionado pelo Imperador) o primeiro passo na compilação do Direito Romano. No século V, o Imperador do Oriente, Teodósio II, promove uma primeira codificação oficial, ainda que apenas contemplasse as constituições imperiais promulgadas depois de Constantino, o primeiro imperador cristão.
Era nitidamente insuficiente. O Direito Romano não surgira com Constantino e a riqueza jurisprudencial romana precedia o reinado do Imperador cristão. É a obra de Justiniano que mudará tudo isto.
Justiniano, entre 528 e 529 encabeça a equipa que dará origem ao Códex Justinianus, um agregado dos materiais anteriormente codificados (não só os não oficiais já referidos como os oficiais de Teodósio II) que, para além da sua função agregadora, adapta também algumas das antigas disposições à realidade bizantina e à vontade do Imperador de então. Em 534 é publicada uma segunda versão do códex, que se tornara necessária pro causa do grande numero de constituições inovadoras promulgadas a partir de 530, sendo os critérios de compilação semelhantes aos da edição precedente. Entre 534 e a data da sua morte, em 565, o imperador continua a promulgar copiosa legislação, inovadora em vários campos do direito: estas novas constituições, chamadas Novellae, não são reunidas em compilações oficiais, mas chegam aos nossos tempos por via de colectâneas privadas.
Justiniano teve o grande mérito de transmitir aos vindouros um património jurídico de inestimável valor que nos seculos seguintse viria a ser, por via directa ou subsidiaria, a base dos ordenamentos jurídicos de muitos países europeus. Mas, ao mesmo tempo, deu a este património a forma de código, aquela que permitiu ao longo dos tempos a sua conservação e a facilidade da sua consulta, embora, como vimos, os romanos nunca a tivessem conhecido.
Assim, ainda que as ambições de reconstrução de um Império Romano por parte de Justiniano se tenham visto goradas, a verdade é que o grande legado de Justiniano – o Direito Romano – sobreviveu até aos nossos dias, e o Império Bizantino – certamente também relembrado por muitos outros motivos – sobrevive assim, nos dias de hoje, dentro dos sistemas jurídicos de um grande número de países.
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